segunda-feira, 13 de julho de 2009

Relações obsoletas

Relações obsoletas
Ariana Pereira


A cada dia incontáveis novidades são adicionadas à lista de invenções tecnológicas desenvolvidas para ajudar o ser humano. Provavelmente, o computador de última geração comprado há um ano já é precedido por outras máquinas superiores, hoje. Assim acontece com aparelhos de televisão, telefones celulares ou técnicas desenvolvidas pela medicina. O homem e a mulher acostumaram-se a trocar rapidamente os produtos que ficam ultrapassados ou que não oferecem mais tantas vantagens quanto na época em que foram adquiridos. Em uma imensa confusão de valores, acaba-se transferindo a ânsia por novidades tecnológicas e novas aplicações de utensílios aos relacionamentos.


Dessa forma, não apenas as invenções humanas como também os relacionamentos tornam-se obsoletos e inicia-se, assim, uma busca incansável pelo parceiro ideal ou que ofereça mais “vantagens” do que o anterior. Relacionamentos relâmpagos, insatisfação constante e solidão são apenas algumas das consequências negativas de uma busca desenfreada pelo mais novo, pelo que proporcione melhores sensações com mais benefícios possíveis. Sem esquecer a necessidade de baixos investimentos de tempo e emoção.

Como estamos habituados a trocar de celular e de carro compulsivamente assim que eles perdem o charme de coisa nova, as pessoas passam a ver a relação amorosa da mesma forma. Buscam permanentemente a sensação de novo que cada relação tem, mas que não é possível perdurar. A ansiedade dos primeiros beijos e transas abre espaço para outro padrão de relação em que o familiarizar-se ocupa o espaço do desbravar. Ocorre que estamos vivendo um momento histórico em que trocar pelo novo tem mais valor do que conhecer o ‘antigo’”, avalia o sociólogo Luciano Alvarenga. O costume de se afastar do outro quando a relação é custosa ou proporciona algum tipo de decepção natural a qualquer ser humano pode custar caro, na opinião do psicoterapeuta Prof. Renato Dias Martino.


Para ele, a cada dia as pessoas se afastam mais e o maior problema na redução do espaço dedicado aos vínculos com o outro é limitar o vínculo consigo mesmo. A capacidade de pensar é o que faz os seres humanos melhores e o pensamento só pode ocorrer quando se compreende o outro em si próprio. “Talvez por não ter ainda desenvolvido a capacidade de ‘ser’ e se ligar às pessoas como se liga às coisas, ou seja, por meio do ‘ter’, algumas pessoas encaram os parceiros como um produto que deve ser trocado quando encontra-se um defeito. Esse tipo de indivíduo me parece materialista. A característica da personalidade materialista tem raízes profundas na experiência da falta na capacitação do reconhecimento do real. Daí a necessidade de confirmação constante do concreto, material, o real sensorial”, afirma Prof. Martino.

Desmascarar

A melhor forma de encarar um relacionamento é saber lidar com o outro passada a magia dos primeiros encontros e iniciada a fase em que as máscaras caem e o parceiro (ou parceira) mostra, aos poucos, quem realmente é. Para isso, de acordo com o psicoterapeuta, é preciso aprender a criar vínculos com alguém real e cheio de incertezas, como qualquer ser humano. O vínculo, prossegue Prof. Martino, possibilita a alguém manter-se ligado a outra pessoa, ainda que não haja a presença física. “Na criação disso que aqui estamos chamando de vínculo é imprescindível a experiência da falta, ou seja, viver a falta deve ser algo possível. Do contrário nunca aceitaremos aquilo que difere do que desejamos que o outro seja, daquilo que ele realmente é.”
Crise sinaliza amadurecimento

O fato de as pessoas evitarem cada vez mais o envolvimento e a superação dos problemas que qualquer relação traz tem feito seres humanos cada vez mais solitários e indispostos a relações sociais. A dificuldade narcisista de sonhar com algo futuro, que inclua o outro, é cada vez mais frequente e o sonho diminui na mesma proporção em que se criam novas embalagens de produtos destinados a pessoas que optaram por viver só, de acordo com o psicoterapeuta Prof. Renato Dias Martino. “Porém, o outro entra em nossa vida sem pedir licença, e daí é muito prudente que possamos ter preparado um espaço dentro de nós para recebê-lo, caso contrário, a confusão é certa. A rivalidade é certa. Um filho aparece e se dá a formação de famílias não pensadas.”

Prof. Renato Dias Martino
Psicoterapeuta e Escritor
Fone: 17-30113866
renatodiasmartino@hotmail.com
http://pensar-seasi-mesmo.blogspot.com