quinta-feira, 2 de fevereiro de 2023

A CONSCIÊNCIA E O VÍNCULO

Antes de discorrer essas breves linhas sobre relacionamento amoroso, seria prudente alertar para o fato de que não existe aqui, qualquer tentativa de se romantizar experiências emocionais-afetivas, já que é possível reconhecer com grande clareza, a real dificuldade do ser humano, no que se refere a renúncia, que possa levar à cooperação, assim como a capacidade de se dedicar ao outro. Inclui-se nessa reflexão o reconhecimento do caráter narcisista, inato no humano.
É bem sabido por esse que aqui escreve, sobre a terrível índole do animal humano e que essa espécie não carrega a capacidade de amar como fator congênito em sua personalidade. Também é de nosso conhecimento o fato de que, se o animal humano não for muito bem nutrido de amor, não conseguirá desenvolver a capacidade de amar a si mesmo e muito menos amará o outro. Inclui-se aqui também, o fato de que toda a dedicação que se possa ter para com o outro é, antes de tudo, um favorecimento para si próprio.
Cada atitude que se tenha de caridade, cuidado e consideração, ao outro, corresponde em essência um crescimento nas esferas mais nobres naquele que se doa. Quando o sujeito se importa com o outro, o maior beneficiado é ele mesmo. No entanto, a dimensão que se expande, quando se dedica ao outro, está muito distante daquelas que se pode compreender por meio do intelecto.
De qualquer maneira, quando tratamos aqui da dedicação ao outro, não estamos nos referindo a atitudes doutrinadas, ou ainda, de tentativas de se fazer algo para conseguir aprovação. Tratamos aqui de certa consequência do desenvolvimento da maturação emocional e afetiva.
Não estamos propondo aqui ser generoso com o outro para que assim, possamos crescer emocionalmente, afetivamente e espiritualmente, mas justamente o contrário; quando evoluímos é que passamos a sermos capazes de renunciar do “eu”, para então, nos doarmos ao outro.
Amadurecemos afetivamente, quando somos capazes de trocar o “eu” pelo “nós”. Nos tornamos pessoas melhores conforme amadurecemos emocionalmente. Entretanto, não se amadurece por se escolher amadurecer. Ninguém decide, ou escolhe se tornar alguém melhor. Essa ordem de amadurecimento ocorre conforme a configuração do ambiente emocional possa favorecê-lo e isso parece estar diretamente ligado ao nível de consciência. O termo consciência, quando submetido às experiências emocionais e afetivas, parecem se aproximar muito de conceitos como os de compaixão e de amor. No entanto, imperiosamente dentro da possibilidade de se viver um amor verdadeiro, ou seja, o amor que esteja irrigado de sinceridade. Aquele amor que possa nutrir o outro sem que empobreça o eu. Aprender a amar parece ser a única forma de se expandir a real consciência. Por mais que possamos encontrar propostas de leitura de textos, exercícios mentais, experiências espirituais e até mesmo o uso de substâncias retiradas da natureza, ou ainda que sejam fabricadas em laboratório, que prometam a ampliação da capacidade de consciência, não me parece possível qualquer outra forma dessa ordem de expansão, que não seja realizada através de um vínculo afetivo saudável.
O acordo que se possa firmar com a realidade só pode ser realizado a partir do vínculo saudável. A vida se propaga através dos vínculos. É somente pelo vínculo que passa a ser possível nutrir o processo de reconhecimento, respeito e responsabilização quanto a realidade. Esse processo do acordo com a realidade deve ocorrer a partir da capacidade de amá-la apesar do desconforto que ela possa gerar no seu reconhecimento. A maior manifestação do acordo com a realidade é a compaixão. Somente a partir de um vínculo saudável que seja estabelecido com o outro, que se aprende a amar esta realidade, que existe independente das expectativas. Ora, é justamente a partir deste envolvimento com a realidade, que ocorre independente do que se gostaria que ela fosse, é que se vai ampliando a consciência. Não tratamos aqui simplesmente de se ter ciência dos fatos, naquilo que se pode saber, mas da consciência, naquilo que é possível compartilhar com o outro: a com – ciência.