terça-feira, 7 de maio de 2024

MEMÒRIA - Prof. Renato Dias Martino



Normalmente, a gente tem a ideia de que um sujeito que tem uma boa memória é um sujeito favorecido, é um sujeito mais bem sucedido, por assim dizer, do que o outro que não tem uma memória muito boa. Na verdade, um sujeito que é capaz de ter uma memória boa quer dizer que ele tem na sua mente, um cabedal enorme de dados armazenados e isso, muitas vezes, não é saudável. O saudável é viver uma vida espontânea, no fluxo contínuo da vida. 

MOTIVO DA MEMÓRIA

A memória, por si só, é mantida por medo de esquecer, por um “deveria ser”. Quando o sujeito tem uma boa memória, tem esta capacidade, porque o resgate daquela memória pode trazer para ele, ou tirá-lo de certa ameaça, ou trazer para ele a aprovação do outro. A memória tem um objetivo claro que é o benefício superficial do sujeito. Não tem a ver com questões profundas. 

MEDO DE PERDER

A memória está dentro da perspectiva do obter. Eu tenho na memória e se eu tenho na memória, eu também tenho medo de perder. Porque o medo de perder está relacionado ao desejo de ter.

MEMÓRIA FRIA

Para que a memória possa ser bem registrada e possa ser resgatada quando necessário, de maneira ágil, ela não pode estar irrigada de emoções nem de afetos. Um sujeito que tem uma boa memória é um sujeito que não relaciona a esses dados, emoções, ou afetos, sentimentos, para que esses dados sejam armazenados de maneira fria e calculista, para serem resgatados da mesma forma quando necessário for. 

MEMÒRIA E DEFESA

Muitas vezes, o sujeito tem uma boa memória para esconder, para tamponar, por assim dizer para tampar questões afetivas desconfortáveis de serem relembradas um sujeito de boa memória pode estar usando isso para se defender de algo que é muito doloroso para ele.

LEMBRANÇAS ENCOBRIDORAS

Uma rica contribuição do Freud, LEMBRANÇAS ENCOBRIDORAS. Quando o sujeito vive uma experiência extremamente dolorosa e desconfortável, ele tende a registrar alguma outra coisa no lugar daquela experiência. Ele registra um fato que foi relacionado àquilo. Se lembra deste fato, mas não consegue se lembrar daquilo que está por baixo por assim dizer.

MEMÒRIA OU RECORDAÇÃO

Memória e recordação. A memória não pode estar vinculada as emoções porque as emoções desorganizam as emoções propõem transformação e os dados da memória não podem estar em transformação porque quando o sujeito for resgatar já não é mais o mesmo e aí não é memória. Mas, por outro lado, aquilo que está na ordem das recordações são, o tempo todo, transformações. Cada vez que você recorda alguma coisa, você recorda de uma maneira nova, de uma outra forma, porque diz respeito ao vínculo. Por mais que seja de alguma coisa que já passou, você, ao se transformar, você se vincula a aquele dado armazenado na memória de maneira diferente. Por isso é recordação, cada vez que você recorda você dá outra vez para o coração. Re-cor-dar! Então, isso vai se transformando. Isso vai se nutrindo. Isso vai crescendo, se expandindo, ficando cada vez mais nobre. Diferente dos dados da memória que são sempre do mesmo jeito. Não só o resgate do que foi registrado na memória, diz respeito à dificuldade de lidar com aquilo que está acontecendo no presente, mas também o próprio registro do fato. Quando o sujeito tem um conflito, quando o sujeito não é capaz de viver de maneira espontânea aquilo que está acontecendo, ele tende a registrar aquilo na sua memória. Diferente porque, isso espontaneamente vem dentro da perspectiva da recordação, que é diferente de buscar, de resgatar isso, dentro dos dados armazenados na memória.

DE NOVO

Nós temos três palavras que estão associadas de maneira muito bela. Então, a gente tem a palavra recordar, a gente tem a palavra respeito e a gente tem a palavra reconhecimento. As três palavras começam com o prefixo RE, que quer dizer “de novo” e todas elas têm essa conotação de, novamente submeter a um processo de renovação. Recordar, “dar novamente ao coração”, respeito, “prestar atenção novamente” e reconhecimento, “conhecer de novo”.

RECONHECER E GRATIDÃO

A ideia de recordar está ligada ao respeito, está ligada também ao reconhecimento. E a palavra reconhecimento, ela também tem esta polissemia, esses sentidos diversos, que podem ser atribuídos a ela. Por exemplo, reconhecer é conhecer novamente, reconhecer é também uma extensão da gratidão. Quando o sujeito reconhece alguma coisa, ele está sendo grato a aquilo. Para que o sujeito seja capaz de reconhecer, ele precisa ter desenvolvido a capacidade de gratidão.

RECORDAR E TRANSFORMAR

 Quando a gente está falando de emoções, quando a gente está falando de afetos, de sentimentos, a gente não pode ligar isso a certezas, mas sempre há um fluxo, há algo que é incerto, porque está em transformação. Então, a recordação vem como algo que é contínuo, é um processo. O resgate do que está na memória não tem a ver com processo, tem a ver com resgatar algo que foi pré-estabelecido, foi armazenado e agora é resgatado de maneira, quanto mais precisa possível. A recordação é rica, ela se transforma. Cada vez que você amadurece um pouco, você se recorda de algo de maneira diferente. Antes eu me recordava de uma forma, hoje eu me recordo de outra forma e futuramente me recordarei de outra maneira diferente dessas. Então, não pode ter certeza.



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