quinta-feira, 19 de junho de 2025

SER MÃE - Prof. Renato Dias Martino




APRENDER COM A MÃE

Quando o Winnicott vai falar da mãe suficientemente boa, ou quando o Bion vai falar da mãe continente, não está querendo ensinar a mãe. A psicanálise não ensina a mãe, mas a psicanálise aprendeu com a mãe o que é ser continente, o que é ser amorosa, o que é ser suficientemente boa o que é ser dedicada comum. A psicanálise aprende com a mãe. A psicanálise não ensina a mãe, até porque, ensinar é sempre duvidoso.

MATERNÁGEM 

A psicanálise aprende com a mãe. Quando o Bion traz a ideia da capacidade negativa ele vai dizer assim: "Rebaixar o resgate dos dados da memória, rebaixar a expectativa no desejo e rebaixar a ânsia de saber, que na realidade é a ânsia de encaixar a experiência no já sabido." Quando ele vai propor isso, ele está propondo na realidade, justamente a função materna adequada. Uma mãe que está exercendo a sua função materna adequadamente é uma mãe que não fica apegado as coisas que ela se lembra do seu filho. O passado já passou é o aqui e agora com esta criança. E da mesma forma, é uma mãe que não fica projetando as suas expectativas e aquilo que ela gostaria que o filho fosse nesta criança. E da mesma forma, é uma mãe que aprende com cada experiência, logo, ela não está dentro do já sabido, do eu sei tudo. Então, a capacidade negativa coincide com o exercício da maternágem saudável.

SUFICIENTE

Como é que esta mãe suficientemente boa pode exercer esta função? Qual é o fundamental fator? O amor próprio! Ela precisa ser capaz de amar a si mesma. Quando ela é capaz de amar a si mesma, ela será capaz de amar o seu filho suficientemente bem. Algumas vezes exagerando, algumas vezes falhando, mas cumprindo suficientemente bem.

CULPA

É claro que a mãe que não conseguiu dar afeto, ou criar um ambiente propício para o desenvolvimento do afeto com o filho, foi uma mãe que não teve isso também. Em nenhum momento a psicanálise real, uma psicanálise saudável, tem o intuito de culpabilizar qualquer que seja a pessoa. Mas na realidade, é justamente o contrário, é dissolver o sentimento de culpa que não tem um fundamento na realidade. O sujeito chega na clínica se sentindo culpado porque não conseguiu estabelecer um vínculo saudável com a sua mãe. Mas na realidade, a sua mãe não foi capaz de propiciar este ambiente para que ele estabelecesse. Não é empurrar esta culpa para a mãe, mas é mostrar para ele que ele não pode se sentir culpado por isso porque tudo que está na esfera do vínculo é responsabilidade dos dois.

VÍNCULO E INTEGRAÇÃO

A única maneira que o sujeito encontra de criar uma conexão consigo mesmo é a partir da conexão com o outro. Não tem como o sujeito aprender a se vincular a si mesmo, a integrar-se a si mesmo sem que ele tenha vivido uma relação saudável com o outro. É só a partir disso, para que este modelo possa ser introjetado e eu aprenda a me vincular de maneira saudável comigo. E a psicoterapia tem este intuito.

A MÃO QUE BALANÇA O BERÇO

E tem uma frase do Abraham Lincoln, que foi presidente do dos Estados Unidos e depois virou tema de um filme de suspense muito bacana que é: A mão que balança o berço governa o mundo. A forma como a mãe cuida do bebê vai fazer com que ele se torne um exemplar do ser humano que irá configurar a sociedade, que irá trazer o futuro da própria humanidade. Então, não é deixar um mundo melhor para os filhos, mas é deixar filhos melhores para o mundo.

MODELO MATERNO-PATERNO

Uma pessoa que conseguiu ser uma mãe suficientemente boa será uma psicoterapeuta boa. Um sujeito que conseguiu ser um pai suficientemente bom, ele será um psicanalista suficientemente bom. Isso o qualifica para tal. Este mesmo modelo que a mãe usa com o filho, que a mãe generosa, que a mãe paciente, que a mãe tolerante, que a mãe suficientemente boa, que a mãe continente usa com o filho é o mesmo modelo que a psicoterapeuta vai usar com o seu paciente. 



quinta-feira, 12 de junho de 2025

PROPICIAR OU PROMOVER - Prof. Renato Dias Martino


FUNÇÃO PSICOTERAPÊUTICA

 

O psicoterapeuta tem a função de propiciar a possibilidade de reparação afetiva e emocional, ele não tem a função de promover. Ele não promove, ele propicia. Qual é a diferença? Promover é ele quem faz, propiciar é abrir espaço para que possa acontecer. Então, tem um abismo entre essas duas coisas. A nossa função enquanto psicoterapeuta é propiciar um ambiente que seja favorável à reparação emocional e afetiva nos vínculos, não proporcionar.

 

PROPICIAR

 

Quando eu proporciono alguma coisa, sou eu que faço, eu que trago a coisa, eu proporciono aquilo. O sujeito que proporciona, ele é quem provoca a coisa, é ele quem faz a coisa. O sujeito, quando ele propicia, ele abre espaço para que a coisa possa acontecer. Então, existe uma diferença entre o psicoterapeuta que se propõe a proporcionar e o psicoterapeuta que se propõe a propiciar. Propiciar é abrir espaço, favorecer um ambiente para que a experiência possa acontecer. Proporcionar é ele quem faz a experiência acontecer. Eu não posso prometer isso. Eu não proporciono nada, eu propicio.

 

HUMILDADE

 

A mudança de proporcionar e propiciar é um exercício de humildade. É reconhecer que eu não proporciono nada, que eu não sou capaz de proporcionar nada, mas eu posso propiciar, porque quando eu propicio, eu também trago a responsabilidade para o paciente. O paciente também tem a responsabilidade nisso. Depende também da capacidade do paciente, se essa experiência vai acontecer ou não, essa experiência de reparação. Quando eu proporciono, não importa o paciente, não importa a capacidade do paciente, eu vou proporcionar. Não! Eu não vou proporcionar, eu vou propiciar.



sexta-feira, 6 de junho de 2025

DESAPEGO E AMOR - SE TORNAR DESNECESSÁRIO - Prof. Renato Dias Martino



PROBLEMA CONTEMPORÂNEO
 
A relação da experiência de amar e do desapego. O amor está completamente subordinado à capacidade de se desapegar, de se tornar desnecessário e lembrando que para que alguém possa se tornar desnecessário, ele precisa ter sido necessário um dia. Não tem como se tornar desnecessário se um dia você não foi necessário. E este é um grande problema contemporâneo, porque as crianças não podem mais contar com os pais. As crianças não podem mais necessitar dos pais, logo elas não conseguem se desapegar desta necessidade de ter a função do pai ou a função da mãe na vida delas.

IMPORTÂNCIA REAL

Quando a gente trata do desapego, em nenhum momento a gente está falando de desinteresse, de descaso, mas a gente está falando de uma experiência de conseguir desapegar-se de alguma coisa que a gente um dia foi apegado. Então, existe um processo para acontecer o desapego e este processo inclui o apego. Primeiro se sente apegado e depois se desapega. No senso comum, se tornar desnecessário causa um desconforto. Parece que você vai perder a importância para o outro, mas na realidade, é justamente o contrário. Quando você se torna desnecessário para o outro é que acontece uma experiência de importância real, de um vínculo saudável.

DESDOBRAMENTO SAUDÁVEL 

Ninguém tem que se desapegar. Isso é de fundamental importância. A experiência do desapego não pode estar no lugar da expectativa, não pode estar no lugar do “deveria ser”, do “deveria desapegar-se”. O desapego vai acontecer como um desdobramento de uma relação bem-sucedida, de um vínculo saudável. O vínculo saudável se desdobra no desapego.


DEPENDÊNCIA 

A dependência é uma palavra delicada que precisa ser cuidada como delicada, porque a dependência não é ruim. A dependência não é nociva, mas a dependência precisa ser um estágio do processo a dependência. Precisa ser uma forma de desenvolvimento de um vínculo um vínculo bem-sucedido. Tem um início na dependência, mas precisa se desdobrar na independência. Um vínculo onde o sujeito não é capaz de amar, não é capaz de cultivar uma relação de amor sincero e saudável, a dependência vai se instalar como um fator cristalizado e engessado.

DOS PAIS

Na relação mãe e bebê, na relação mãe e filho, ou pai e filho a maior dificuldade do desapego está no pai e na mãe. A criança vai estar pronta a se desapegar na medida em que o adulto esteja sendo capaz de viver essa experiência. Como é que o adulto vai manifestar esta capacidade? Através da sua disponibilidade de estar cumprindo a sua função adequadamente.

FUNÇÕES

Incapacidade a dificuldade que as mulheres têm hoje de cumprirem a sua função materna e muito por conta da ausência do companheiro que possa estar ali do lado, se responsabilizando por aquela relação e cuidando daquilo que também é da sua função, tem que ser ampliado cada vez mais. A gente percebe isso com muita clareza na prática clínica. A gente percebe mulheres incapazes de cumprir a sua função de mãe e muitas vezes, aquelas que estão cumprindo essa função se sentem menosprezadas, porque na realidade, elas não conseguem ser reconhecidas na sua função, que na realidade, é a função, talvez seja a função mais nobre que possa existir na humanidade, ou na existência.

INSUFICIÊNCIA 

Para que um vínculo de dependência continue sendo um vínculo de dependência sem conseguir evoluir para um outro modelo mais nobre, acontece impreterivelmente a insuficiência desta dependência. Quando o sujeito não consegue estar sendo dependente do outro porque o outro não está disponível a isso, então ele prolonga isso. Ele fica sempre esperando mais, porque não foi cumprido, porque ele não pôde realmente ser dependente. E aí, ele passa a ser um sujeito eternamente dependente de tudo. Ele não pôde depender da mãe, ele não pôde depender do pai e aí, ele continua sendo dependente. Dependente do estado, dependente do governo, dependente do “Bolsa Família”, dependente das coisas da vida e não consegue ter independência, porque na realidade, nunca pôde ser realmente dependente no tempo em que ser dependente era adequado.

VÉU DE MAYA

A palavra Maya, na sua semântica, quer dizer aquilo que pode ser medido, ou seja, aquilo que está na perspectiva material, concreta. O sujeito que não teve uma relação bem-sucedida dentro do âmbito emocional e afetivo, permanece com o Véu de Maya, apegado à materialidade das coisas. O sujeito que não aprendeu a tolerar a ausência da mãe, tolerar a ausência do pai. Como é que se tolera a ausência da mãe e do pai? Confiando que eles irão voltar. Acreditando que a mãe foi, mas volta, acreditando que o pai foi, mas volta. Quando o sujeito não conseguiu ter esse tipo de experiência, ele se apega à materialidade das coisas, ele se apega à Maya. Maya é ilusão. O Véu de Maya é estar iludido, mas o sujeito que não conseguiu se desenvolver emocionalmente, logo afetivamente, continua pegado aquilo que pode ser medido e o amor não pode ser medido. Mas ele continua apegado a isso.

CONSIDERAÇÃO

Qual é a semântica da palavra considerar? COM, quer dizer junto e SIDERARE quer dizer sideral. O espaço sideral. Considerar é implicar o todo, é estar junto do todo e desconsiderar é o mesmo radical da palavra desejo DESIDÉRIUM, CONSIDÉRIUM, considerar é incluir o todo. Desejar é desconsiderar o todo. Então, o sujeito, quando deseja, ele não inclui o todo, ele só olha para aquilo que ele deseja.

FRUSTRAÇÃO E ABANDONO

Na vida adulta, quando o outro me frustra, eu abandono. Ou seja, se não existe uma coincidência com aquilo que eu tenho expectativa, deixa de existir para mim. Hanna Segal vai chamar isso de equação simbólica. Se não existe fora, também não existe dentro. Este é um modelo de dependência na vida adulta que é nocivo. Se não corresponder aquilo que eu gostaria que fosse, não existe mais não serve mais para mim, ou eu vou chorar e vou reclamar e vou incitar culpa, vou incitar remorso até que você faça aquilo que eu quero que você faça.

MULHER E MÃE 

Muitas vezes, uma mulher que nunca foi capaz de reconhecer as suas virtudes como mulher, pode ver num vínculo de dependência com o filho, uma forma de se reafirmar. E aí, ela pode se apegar a esse modelo e não se desapegar disso. Mesmo que o filho esteja crescendo. Porque senão ela vai retornar àquele estado do qual ela não acreditava em si mesma. E aí, ela pode estimular essa dependência ad aeternum, por assim dizer. Essa criança não vai conseguir se independer. A mulher nunca confiou nela mesma. E aí, ela tem um filho que olha para ela com um olhar de desejo que ela nunca tinha experimentado na vida e agora para elas desapegar deste olhar desejoso dessa criaturinha que depende dela é muito difícil.

AMAR A SI MESMA

A mulher não aprendeu a amar a si mesma, por isso não conseguiu amar o marido e por não conseguir amar o marido passa a ser dependente do olhar deste filho que vê nela tudo que ele precisa. E ela passa a se tornar dependente deste olhar de desejo do filho em relação a ela. E aí, é como se ela dissesse assim: "Eu abri mão da minha vida para cuidar de você e você está querendo se tornar independente? Como? Como que você quer crescer? Como que você quer ser um adulto?”

DUAS DEMANDAS 

Duas demandas que a gente recebe na clínica. Ou porque a mãe não foi capaz de suprir a dependência do bebê e por conta disso ele não foi capaz de se independer, ou porque a mãe prolongou esta dependência para além do saudável e da mesma forma ele não conseguiu se independer. Essas duas demandas é o que futuramente iremos receber na nossa clínica.

RESPEITO

O respeito é elemento fundamental dentro de uma clínica bem-sucedida, de uma clínica psicanalítica real e adequada, o respeito é o elemento que está entre o reconhecimento e a responsabilização. É uma transição. É um elemento transitório entre a possibilidade de reconhecer e a possibilidade de passar a se responsabilizar. Respeito = RESPECTUS. A semântica da palavra. RE quer dizer de novo e ESPECTUS quer dizer prestar atenção. Quando eu presto atenção novamente é porque eu reconheci e estou aprendendo a me responsabilizar. Quando o respeito é introduzido, qualquer que seja o elemento nocivo começa a se dissolver, a ruir, a deixar de prejudicar o sujeito e as suas relações, mas este respeito vai precisar ser introduzido pelo analista. O analista começa a respeitar o paciente e traz uma um novo modelo de vínculo para este paciente. Na medida em que esse paciente começa a experimentar esse novo modelo de vínculo, ele começa a introjetar este modelo de vínculo dele para ele mesmo e não vai mais permitir qualquer outro modelo de vínculo com qualquer outra pessoa que seja.

RESPEITO E INDEPENDENCIA

Quando a mãe respeita o desenvolvimento do bebê, ela assiste o bebê se independer dela. É fácil pra mãe ver um filho se independer dela? Não! Não é! Muitas vezes, ela quer que ele seja independente em certos aspectos e em outros aspectos ela não quer. Aspectos que são convenientes para ela, ela quer que ele continue sendo dependente e aspectos que são convenientes para ela, ela quer que ele se desenvolva. Não! O desenvolvimento precisa ser no todo. Não é só naquilo que você gostaria que fosse.

CULPA PRAZEROSA

Pode parecer paradoxal isso que eu vou dizer. Pode parecer até um contrassenso o que eu vou dizer, mas a culpa é prazerosa. O sujeito pode se manter com um sentimento de culpa para se defender de um monte de coisas. A única forma de dissolver o sentimento de culpa é pela responsabilização e muitas vezes o sujeito não é capaz de se responsabilizar. Então, ele mantém a culpa, porque se a culpa for minha, eu coloco em quem eu quiser.

DEPENDÊNCIA CONVENIENTE 

Muitas vezes, a pessoa reclama que o outro depende dela, mas isso está sendo conveniente para ela. Ela se sente extremamente importante tendo alguém dependendo dela, mesmo que ela reclame disso. Quando alguém depende de mim, isso pressupõe que esta pessoa é menos que eu e aí eu me sinto superior, por mais que eu reclame disso. Por mais que eu sinta o peso dessa pessoa dependendo de mim, ainda assim eu me sinto superior.

MEDO E DESEJO

O medo de perder é filho do desejo de posse. Então, todas as vezes que houver ali esse desejo de posse, de possuir o outro, de controlar o outro, o medo da perda sempre vai ser exacerbado, sempre vai ser maior e ele quer controlar o outro porque na realidade depende do outro.

O FILHO DA DEPENDÊNCIA

Emocionalmente, o amor é filho da dependência, mas o amor não é a dependência. Se não houve a dependência, não se desenvolve amor. Precisa ter havido dependência, mas essa dependência precisa ser transitória. Ela precisa ser transicional de um modelo para o outro. Da dependência para independência.


DEPENDÊNCIA SAUDÁVEL

O filho dependeu da mãe, hoje a mãe idosa, depende do filho. A dependência é um elemento das relações saudáveis, se for transitória, se estiver disponível a transformação. A dependência é nociva quando ela está no aspecto invariante. Quando ela está cristalizada, ela é nociva.

LUTO E INDEPENDENCIA

Dói se tornar desnecessário. Dói mais para mãe se tornar desnecessária do que para o filho não precisar mais da mãe, dispensar a mãe. É muito doloroso, é luto, é um sentimento de luto. A mãe, quando desmama o filho, ela se sente enlutada.




sexta-feira, 30 de maio de 2025

NEUROSE, PSICOSE, PERVERSÃO E AMOR - Prof. Renato Dias Martino


NEUROSE E PSICOSE

 

A neurose, essencialmente é configurada por um desejo perverso reprimido. Quando se deseja alguma coisa e se é reprimido nesse desejo perverso, isso claro na infância, o sujeito desenvolve um sintoma e esse sintoma é um sintoma neurótico. Existe uma parte do sujeito que não concorda com a realidade. Um pedaço desse sujeito que não concorda com a realidade. E este pedaço gera um sintoma. Esta parte gera um sintoma. Este é o sujeito que tem a predominância neurótica da mente. O psicótico já é o contrário. O psicótico tem só um pedacinho que é ligado na realidade e o resto todo é cindido. Ele não está na realidade. Só um pedacinho mínimo para que ele possa conviver.

 

PERVERSO POLIMORFO

 

O Freud chamava o bebê de perverso polimorfo. Por quê? Porque o bebê se satisfaz de várias maneiras. Com a boca, mamando. Ele se satisfaz evacuando. Perversão é se satisfazer de alguma forma que não seja a cópula. O órgão genital masculino com o órgão genital feminino. Quando a criança é reprimida nesta sua satisfação, que naquele tempo é saudável, ele desenvolve um desejo substitutivo, que vai se configurar num sintoma. Então, todo sintoma neurótico é uma perversão reprimida. O Freud vai dizer assim: "A neurose é o negativo da perversão".

 

SINTOMA NEURÓTICO

 

O bebê não mamou no tempo adequado e desenvolve na vida adulta uma compulsão alimentar que vai levá-lo à obesidade. O desejo perverso que é se satisfazer com a mucosa da boca vai se converter num desejo de comer abusivamente. A necessidade de se nutrir junto com a satisfação sexual da mucosa, que é, a princípio perversa, porque não é uma satisfação dos órgãos sexuais, reprimida vai levar o sujeito a desenvolver um desejo substitutivo com a promessa de que vai trazer essa satisfação que ele precisaria lá atrás. Vai levá-lo a desenvolver um sintoma neurótico e vai gerar a obesidade, vai gerar a compulsão alimentar.

 

O AMAR

 

A maturidade emocional leva o sujeito a renunciar de desejos e se integrar às vontades que são necessidades. Quanto mais maduro emocionalmente o sujeito for, ele vai priorizar as suas necessidades. E esta priorização também inclui a capacidade de adiar estas vontades. Ser capaz de adiar as vontades faz parte da sua maturidade emocional. Ele é capaz de adiar as vontades, renunciar de desejos e com isso ele amplia sua capacidade de se doar que é justamente o amar.



sexta-feira, 23 de maio de 2025

AMAMENTAÇÃO - Prof. Renato Dias Martino


INTERRUPÇÃO

 

Amamentação é um fator da função materna. Se, por acaso a amamentação teve que ser interrompida bruscamente, todos os outros fatores, ou a maior parte dos outros fatores da função materna precisam estar funcionando de maneira bem-sucedida. Se os outros fatores estiverem funcionando de maneira bem-sucedida, a interrupção da amamentação não vai comprometer. O problema é quando a amamentação que é interrompida bruscamente vem com a interrupção de outros fatores da função materna. Porque, a mãe pode continuar cuidando com carinho, com dedicação, mesmo que a amamentação tenha sido interrompida bruscamente, pode lançar mão de outros recursos e continuar nutrindo o bebê de carinho, de cuidado de atenção, de reconhecimento.

 

MAMADAEIRA

 

A mãe, por exemplo, pode ter um problema de não produzir o leite e lançar mão do recurso da mamadeira no lugar do seio. Quando ela está sendo suficientemente boa, quando ela está sendo dedicada comum, como diria Winnicott, ela vai lançar mão da mamadeira e vai cuidar do bebê independente do leite estar saindo do seio. Por outro lado, uma mãe pode dar o seio, pode estar produzindo leite e não conseguir passar o afeto a partir das mamadas. Estar dando mamá para o bebê, desconfortável, fazendo aquilo lá a contragosto. E é pior do que dar a mamadeira.

 

DESMAME

 

O desmame é muito mais difícil para a mãe do que para o bebê. A criança se adapta rapidamente no desmame, a mãe nem tanto. Principalmente se a mãe tiver ali, projetando na amamentação elementos que não foram bem elaborados na vida dela. Aí ela vai estender essa amamentação muito mais do que o necessário, ou vai interromper na medida em que ela esteja se sentindo desconfortável com aquilo. Muitas vezes, a mãe pode manter a amamentação do filho para se defender de alguma situação, por exemplo.

 

OUTRA MÃE

 

Uma mãe que cuida de dois filhos, ela nunca cuida da mesma forma dos dois filhos. Me desculpe! Me perdoe! Essa mãe era uma quando nasceu um filho e ela é outra quando nasceu outro filho. Ela está em desenvolvimento. Ela está passando por situações, por contingências completamente diferentes quando nasceu um e quando nasceu o outro. Pode ter nascido o primeiro filho e ela cuidou desse filho numa fase muito tranquila da vida dela, numa tranquilidade financeira, numa tranquilidade emocional, numa tranquilidade afetiva. Quando chega o segundo filho pode acontecer um monte de problemas e esses problemas podem afetar na criação deste filho. É um papo muito furado esse de falar: "Ah! Eu cuidei dos dois filhos, igual. Eu criei os dois...” Não! Não cuidou! Não! Não criou! E eu não estou tentando culpar ninguém por isso, mas falar isso é uma falácia! É uma mentira! Porque não acontece dessa forma.


sexta-feira, 16 de maio de 2025

DO NARCISISMO PRIMÁRIO AO PSICODIAGNÓSTICO - Prof. Renato Dias Martino



PRIMÁRIO E SECUNDÁRIO 

Narcisismo primário é uma etapa do desenvolvimento da personalidade do bebê onde ele vê na mãe aquilo que ele necessita. Então, ele se vê na mãe. A mãe é um espelho das suas necessidades. Narcisismo primário é uma fase saudável do desenvolvimento emocional e afetivo. O narcisismo secundário acontece por conta de um insucesso no narcisismo primário. O narcisismo secundário, então não é saudável. O narcisismo secundário é sintomático, vai trazer um desdobramento repetitivo daquilo que não pôde ter sido suprido na época do narcisismo primário. Quando o bebê começa a perceber que existe uma outra pessoa além dele. Esta outra pessoa é a mãe e aí ele começa a viver uma relação com essa mãe por identificação. Relação por identificação é quando o outro não é outro, mas o outro é uma extensão de mim. Esta etapa do desenvolvimento, o Freud chamou de narcisismo primário. Quando acontece resquícios de insucesso desta fase, estes resquícios vão configurar um narcisismo secundário.

SECUNDÁRIO 

Uma parte da experiência que acontece no narcisismo primário não pôde ter sucesso e esta parte vai se desdobrar num narcisismo secundário. A parte bem-sucedida do narcisismo primário é aquela que se desdobra no reconhecimento do outro como outro, o que o Freud vai chamar de relação objetal. O outro não é uma extensão de mim, assim como na relação por identificação, mas o outro é um objeto externo. Então, é uma relação objetal. Algumas experiências não conseguiram passar do narcisismo primário, ou seja, da relação por identificação para a relação objetal e estas experiências que não conseguiram. Isso vão se desdobrar num narcisismo secundário. Dentro do narcisismo primário, o bebê tinha necessidade de ser reconhecido pela mãe. Ele tinha necessidade de se ver na mãe. Quando ele não consegue isso, ele vai desenvolver um desejo substitutivo desta necessidade e este desejo substitutivo a gente vai chamar de narcisismo secundário. E aí, ele vai projetar isso que não pôde ser suprido pela mãe nas outras pessoas, futuramente e também na mãe, futuramente. Vai cobrar da mãe, vai manter uma relação fusionada com a mãe. Isso tudo se configura no narcisismo secundário, ou seja, aquilo que não pôde ser bem-sucedido no narcisismo primário.

RELAÇÃO FUSIONADA

quando o narcisismo primário não é bem-sucedido e não pode ser bem elaborado para se desdobrar naquilo que a gente vai chamar de relação objetal fatalmente os relacionamentos na vida adulta vão se tornar relacionamentos fusionados ou relacionamentos onde um não consegue reconhecer o outro como o outro mas imagina que o outro seja uma extensão do eu e isso a gente vai chamar de narcisismo secundário o outro existe para satisfazer os meus desejos assim como no narcisismo primário a mãe existe para satisfazer as necessidades do bebê quando a mãe não conseguiu existir para satisfazer as necessidades do bebê essas necessidades vão se desdobrar substitutivamente em desejos onde o adulto vai obrigar o outro a satisfazer senão ele vai ficar muito bravinho no

PROPORÇÕES 

Um dos maiores fundamentos do que a gente tem como psicanálise do acolhimento é o desenvolvimento e a reflexão e a expansão da ideia das cotas. A ideia das proporções de tudo que está no humano. Tudo que está no humano está em cada um de nós. Cada um de nós tem um pouco de tudo de saudável e de tudo de nocivo. Uma das maiores contribuições do Freud foi que todos nós somos neuróticos em alguma medida. Uma das maiores contribuições do Bion, foi que todos nós somos psicóticos em alguma medida. Isso deve ser expandido para todas as características presentes nos seres humanos. E aí, a gente volta lá no filósofo Terêncio Afro da época medieval.

PSICODIAGNÓSTICO 


A intolerância quanto a isso, a intolerância de reconhecer essas características e reconhecer essas características vai ser fundamental para que eu possa aprender a respeitar essas características e me responsabilizar por essas características, moldando o funcionamento da minha personalidade. Isso que faz cada um ser de uma forma. A dificuldade de reconhecer isso vai trazer a exacerbação dos psicosdiagnósticos. Então, hoje qualquer manifestação que não seja socialmente aprovada é passiva de ser catalogada pelo CID, pelo DSM e o sujeito vai passar a ser o “laudado”. O laudado na escola, laudado no trabalho, laudado na família. O sujeito que foi caracterizado patologicamente por conta de uma característica que é sua que faz parte da sua personalidade e quanto mais ele é catalogado, quanto mais ele é diagnosticado, menos ele é capaz de se responsabilizar por isso, menos ele é capaz de reconhecer isso como característica sua, aprender a respeitar isso e aprender a se responsabilizar por isso. Porque isso já não é dele. Isso é uma patologia, logo é responsabilidade do psiquiatra, do neurologista, ou sabe lá de quem. E aí, ainda por cima ele pode requerer cotas de benefícios que possa favorecê-lo, porque ele foi laudado com aquele psicodiagnóstico e aí, a gente vai entrar naquilo que o Freud chamou de ganho secundário, ou seja, ele se beneficia da sua moléstia.



sexta-feira, 9 de maio de 2025

TOLERÂNCIA E FORÇA - Prof. Renato Dias Martino Parte 2




TEORIA DOS SELFS

Winnicott contribuiu com a teoria dos selfies. Ele separa a personalidade em dois selfies, self verdadeiro e selfie falso. Eu verdadeiro e eu falso. Dentro da proposta do Winnicott, o sujeito teria uma essência espontânea chamada eu verdadeiro e um eu falso que, de maneira saudável estaria a serviço de proteger o eu verdadeiro. Quando a gente fala de força dentro do âmbito emocional e nas relações afetivas, nós estamos falando essencialmente do falso eu. Só o “falso eu” pode ser forte. A força não pode ser um atributo do “verdadeiro eu”, porque o “verdadeiro eu” é uma essência. O “verdadeiro eu” é a parte mais primitiva do sujeito, é a parte original do sujeito, é a essência do sujeito. Depois ele vai desenvolvendo a parte externa, que ele chamou de “falso self”. Assim como a fruta que tem o seu fruto verdadeiro ali, mais próximo das sementes e o pseudofruto que está mais externo, nós também dentro da personalidade vamos de maneira análoga, encontrar uma essência próximo das nossas sementes, não é isso? Das nossas origens e uma parte mais externa que vai ser chamado de “falso self”, “falso eu” é o eu social, é aquele que se sociabiliza com o outro. Vale lembrar que, quando a gente fala de “eu social” nós não estamos falando de “eu afetivo”. Relações sociais não são relações afetivas. Relações afetivas não são relações sociais.

REALIZAR OU PRODUZIR 

É importante que a gente possa separar realização de produção. Só o selfie verdadeiro é capaz de realizar, porque só o selfie verdadeiro é espontâneo e criativo. O falso self, o “falso eu” pode, na melhor das hipóteses produzir. Ele produz. Produzir não é realizar. Produzir é padronizado e atende exclusivamente à demanda do outro. A criação que vai se desdobrar na realização é uma extensão da verdade do eu. Por mais que a produção seja para atender a demanda do outro, a realização só pode ser realização quando inclui o outro, mas inclui o outro não para atender a sua demanda, mas porque isso afeta o outro. Porque chega até o outro afetivamente. Enriquece o outro, não simplesmente satisfaz uma demanda.

VOCAÇÃO 

Então, o sujeito tem que ser forte, o sujeito tem que ser inteligente, o sujeito tem que cumprir inúmeras demandas que vem do outro e com isso ele vai perdendo a espontaneidade. Com isso ele vai perdendo a possibilidade de criar. Com isso ele vai perdendo a possibilidade de ouvir a voz sutil da sua própria vocação. Porque desde cedo ele precisou trabalhar para produzir e com isso conseguir a aprovação do outro. Ele precisou fazer alguma coisa que o outro queria que ele fizesse, porque senão ele iria perder a atenção do outro. E aí, ele foi obstruindo a sua capacidade de criação. E aí, quando ele chega na idade adulta... O que eu faço? O que eu estou fazendo? Que profissão que é essa que eu estou? Que relações são essas que eu tenho? O que eu estou fazendo aqui? A essência dele não está ali. A Verdade dele não está ali. Ele não consegue ser verdadeiro na sua profissão, ele não consegue ser verdadeiro nas suas relações, porque a vida inteira ele teve que fazer para cumprir a demanda do outro, ou seja, sendo falso.

FORÇA E PRODUÇÃO

Quando o sujeito não consegue elaborar a produção pela demanda do outro, ele não vai conseguir passar para o próximo estágio, por assim dizer, que é a realização, que é a realização espontânea do seu verdadeiro eu. Ele vai ficar ali, dissimulando, retendo ou expelindo, ou soltando as suas produções, conforme a reação do outro. Muitas vezes o sujeito, ele precisa fazer força para reter ou fazer força para expelir. Então a força está ligada diretamente à produção.

ESPONTANEIDADE 

Falta de criatividade, a dificuldade em exercer a sua espontaneidade na criação, na realização pode vir a ser uma exacerbação do falso eu. Uma vida onde o sujeito precisou construir um falso eu para lidar com as questões que vinham da demanda externa pode vir a trazer para ele um prejuízo na vida adulta de déficit na capacidade criativa, na capacidade de realização, na capacidade de espontaneidade. A personalidade dele acabou sendo estruturada com um investimento muito maior no falso eu do que na nutrição do verdadeiro eu, muito mais na elaboração de mecanismos para satisfazer a demanda externa do que na capacidade de nutrir a essência do eu.

FALSA FORÇA 

O falso eu é um constituinte da personalidade, mas de maneira saudável, este falso eu serve para proteger o verdadeiro eu e de uma maneira nociva ele cresce com a impressão de que ele é a verdade do eu. Isso acontece sufocando o verdadeiro eu.

DISSIMULAÇÃO 

Nós estamos aqui criticando a força? Não! Não estamos criticando a força. A força é necessária, quando for necessário defender o verdadeiro eu. Quando for necessário defender o verdadeiro eu através de uma dissimulação. Tem uma borboleta, uma mariposa, não sei se é borboleta ou mariposa, que tem duas bolas nas asas que parecem dois olhos de coruja. Então, quando ela se sente ameaçada ela abre asas e aquelas duas bolas ficam parecendo uma cara de um predador. Então, nós não podemos criticar as asas da borboleta, ou da mariposa, dissimulando um predador, porque ela está se defendendo, mas ela não é um predador.

INVESTIR

Se eu estiver convivendo num ambiente ameaçador, eu preciso parecer forte. O eu falso é importante na medida que eu esteja inserido num ambiente nocivo, ameaçador. Mas a insistência em se manter num ambiente ameaçador faz com que você se torne falso. Faz com que você confunda a sua essência com o falso eu. É claro que é importante, o falso eu, mas quando este falso eu predomina, o eu verdadeiro padece. E quando eu estou insistindo em conviver num ambiente onde eu sou ameaçado o tempo todo, eu acabo investindo energia muito mais na falsidade do que na minha verdade.

FRAGILIDADE

Na medida em que você não se utiliza do falso eu no momento necessário, adequado, para você se utilizar você, adoece, porque o seu eu verdadeiro fica exposto e o eu verdadeiro é frágil e ele é contaminado com muita facilidade, ele é machucado com muita facilidade. Então, é necessário que eu possa lançar mão do meu falso eu no momento adequado.

INSTINTO 

Todas as vezes que o sujeito estiver se defendendo, esta defesa foi ativada pelo seu instinto de autopreservação. Então, o “falso eu” é ativado pelo instinto de autopreservação, tanto no âmbito tóxico, quanto no âmbito saudável. No âmbito tóxico, quando o sujeito, ele desenvolve um falso eu muito enrijecido, muito proeminente, também foi um instinto de autopreservação que despertou. Por conta do ambiente nocivo, foi obrigado a enrijecer esse falso eu de tal maneira que, hoje ele não dá conta mais, ele não consegue acreditar na sua verdade. Mesmo que ele não esteja mais vivendo num ambiente ameaçador.

FORÇA OBSTRUTORA 

A força é algo obstrutor. O sujeito acreditar que é forte é uma obstrução no caminho da transformação. Quando ele acredita que ele é forte, ele está envolvido numa sensação de onipotência que a transformação fica obstruída de acontecer. Não precisa acontecer transformação nenhuma porque eu aguento! Quando ele chega na psicoterapia, ele começa a perceber que ele não aguenta nada, que ele precisa começar a reconhecer a sua fragilidade. Porque nós somos frágeis e dentro desse reconhecimento da fragilidade, ele vai aprendendo a respeitar a sua fragilidade, se responsabilizar pela sua fragilidade e este processo vai fazer com que a transformação aconteça e ele se distancie daquilo que na realidade vem ferindo, vem machucando, vem intoxicando há tempos.

SER FORTE

A principal utilidade de a gente estar vendo essa ideia de força no nosso diálogo diário e cotidiano, nas nossas conversas e sobretudo na nossa prática clínica é que este conceito pode vir a sugerir uma ativação superegóica. Uma promessa de algo que não é real. Uma promessa, em primeiro momento para si mesmo e depois para o outro. Prometer que o sujeito seja forte. Isso é extremamente nocivo na prática clínica. Não só na prática clínica, na nossa vida cotidiana também é nocivo, porque a nossa natureza é frágil. A nossa natureza, sobretudo dentro da perspectiva emocional e dos vínculos, é de fragilidade e quando a gente está se utilizando do conceito de força, de ser forte, nós estamos promovendo uma ilusão, que depois vai ser cobrada. Tanto pelo eu, quanto pelo outro. Tanto pelo “deveria ser” interno do sujeito, daquilo que ele tem como “ideal de eu”, quanto pelo outro, que julga que nós somos fortes.

NATUREZA EMOCIONAL 

A natureza emocional é frágil. Ter a natureza frágil emocionalmente não quer dizer que o sujeito está enfraquecido. Frágil é a concepção. No entanto, quando o sujeito está inserido num ambiente hostil, ameaçador, é importante que ele pareça forte. Ele é forte? Não! Porque, a sua natureza é frágil. Claro que nós estamos falando aqui do âmbito emocional, mas ele precisa parecer forte, porque ele está inserido num ambiente onde ele é ameaçado o tempo todo e parecer forte é uma defesa. A força emocional é uma defesa. Quando o sujeito é forte emocionalmente é porque ele está cheio de defesas e as defesas são essencialmente ilusões, fantasias, ideais, não tem a ver com a realidade, porque quando o sujeito está de acordo com a sua realidade, ele está frágil.

SELF TOTAL

Um selfie total é a integração do falso selfie com o verdadeiro selfie. É quando o falso self, é quando o “falso eu” está num acordo com o verdadeiro eu. Quando a função do falso eu é proteger o verdadeiro eu. Isso é um self integrado, um eu integrado, mas quando o sujeito acredita ser forte, na realidade a falsidade está sendo mais importante do que a verdade.

AMBIENTE DE PAZ

Quando o sujeito consegue conviver num ambiente saudável, de paz, de sinceridade, de amor de dedicação, ele passa a conseguir manifestar a sua fragilidade natural, a sua natureza frágil. Neste ambiente, ele passa a reconhecer a sua fragilidade e o setting terapêutico e o processo psicoterapêutico serve a este intuito. De propiciar um ambiente saudável para que o sujeito possa reconhecer, aprender a respeitar e se responsabilizar por sua fragilidade.

AMBIENTE SAUDÁVEL 

Quando o sujeito está inserido nesse ambiente saudável, quando ele não precisa investir energia no falso eu, ou seja, investir energia para parecer forte ele consegue ter energia para investir no seu verdadeiro eu, logo para expansão e crescimento das suas capacidades. Essencialmente, capacidades emocionais que é a capacidade de se autoconter, de conter as suas emoções, acolher as suas emoções, aprender a respeitar as suas emoções e se responsabilizar por elas e ampliar a sua capacidade afetiva que é a capacidade de se ligar ao outro, de se dedicar ao outro, de abrir mão do seu pelo outro. Mas isso só é capaz, dentro da perspectiva de um ambiente saudável.

AMEAÇAS

Quanto mais ele investe no falso eu, tentando parecer forte, tanto menos ele tem energia para investir na sua verdade para ampliar as suas capacidades emocionais e afetivas. Porque ele está o tempo todo ameaçado, está o tempo todo tendo que se proteger de uma ameaça. Tanto de uma ameaça interna, que o obriga a ser forte, quanto de uma ameaça externa, que a partir dos ataques podem forçá-lo a parecer forte.

ADOLESCÊNCIA 

Um dos grandes desafios de atender um adolescente é que o adolescente acredita que ele é forte. Ele acredita que ele pode encarar qualquer coisa. Ele tem a vitalidade, a virilidade, a jovialidade a seu favor. Então, ele acredita que ele tem força para peitar o mundo na sua revolta e o trabalho psicoterapêutico está completamente subordinado a o reconhecimento da sua fragilidade. Do sujeito perceber que ele não dá conta de tudo. Do sujeito perceber que ele é frágil perante as questões do mundo. Se ele não dá conta de perceber isso. Se ele não é capaz de reconhecer a sua fragilidade, o trabalho psicoterapêutico é inócuo. Porque o trabalho psicoterapêutico tem muito mais a ver com reconhecer fragilidades do que tornar o sujeito forte.


DA SEMÂNTICA 

O conceito de tolerar tem dois radicais na sua semântica. Tem “tolerare”, que quer dizer aguentar, e tem “tollere”, que quer dizer tirar, destituir. Enquanto um radical te leva a se fazer forte, o outro te leva a destituir aquilo que esteja te ameaçando. Enquanto um te obriga a aguentar, o outro te orienta a destituir aquilo que esteja te ameaçando. Então, quando a gente usa a palavra tolerar, nós estamos aqui nos servindo do radical “tollere”, que é destituir, tirar, ou seja, tolerar é tirar alguma coisa que nos ameaça.

DESENVOLVER TOLERÂNCIA 

A criança vai desenvolvendo tolerância a partir da relação bem-sucedida com a mãe e depois com o pai, mas a princípio com a mãe. Ela confia na mãe, ela internaliza a imagem de confiança que ela tem da mãe e ela passa a tolerar a ausência desta mãe que ora foi internalizada. No adulto que nos procura na clínica, esta tolerância vai ser desenvolvida a partir do vínculo com o psicoterapeuta. Essa tolerância vai acontecendo concomitante com o estabelecimento, a expansão e o estreitamento do vínculo com o psicoterapeuta. A internalização da imagem de confiança que o sujeito tem com o terapeuta vai destituindo a influência do “deveria ser”, do “ideal de eu”, do seu superego e introjetando a influência da dupla analítica que vai dissolvendo esta obrigação, esta exigência que o sujeito impunha a si mesmo.