Já tive outras oportunidades de escrever cogitações sobre esse tema, mas
me parece útil retomar a questão na medida em que perguntas frequentes nas
abordagens feitas aos profissionais da saúde mental sem duvidas são referentes
à depressão. Então decidi nessa linha, trazer a baila novamente esse
questionamento.
Quando alguém apresenta um quadro de depressão, sem duvida se mostra
encapsulado num formato especial de comportamentos que desperta no outro, uma
curiosidade enorme. Isso porque os processos mentais característicos dessa
experiência emocional acontecem internamente, logo de forma ofuscada do olhar
externo.
O pensamento comprometido pela depressão é mantido essencialmente por
fantasias que muito pouco se adéquam a realidade. Normalmente povoadas de uma
crença do regresso daquilo que foi perdido. O sujeito depressivo só vê motivos
em continuar vivendo se vincular essa motivação ao retorno do que foi perdido.
De forma geral descrevemos como depressão, a definição de toda categoria
de elementos que se encontre de maneira rebaixada ou colocada no nível inferior
às outras. Na geografia topográfica, por exemplo, se utiliza do termo para
descrever as regiões mais profundas do terreno. Desta mesma forma, a psicologia
se utilizou desse conceito para descrever o recolhimento dos investimentos
emocionais.
Certa introspecção no funcionamento emocional. O interesse no mundo externo diminui e o funcionamento psíquico passa a compreender, em sua maior parte, apenas os aspectos do mundo interno.
Certa introspecção no funcionamento emocional. O interesse no mundo externo diminui e o funcionamento psíquico passa a compreender, em sua maior parte, apenas os aspectos do mundo interno.
Algumas condições devem existir para que se desenvolva a depressão que
ocorrerá normalmente após alguma perda importante. “Entra-se” em depressão
quando acontece à perda de alguém, ou mesmo de alguma coisa muito importante na
vida do sujeito. Se estivermos aqui falando de um desenvolvimento
saudável do funcionamento mental, a depressão deve compreender certo período de
afastamento das coisas do mundo externo. Um desinvestimento de interesse no
mundo que resultará num afugentamento da vida social.
Essa experiência emocional ocorrerá em qualquer pessoa, em qualquer fase
da vida onde incida uma grande perda. No entanto, existem pelo menos a priori,
dois tipos de depressão.
Um primeiro modelo é a depressão comum que ocorre numa mente saudável.
Esse tipo de depressão se pronuncia sempre que perdemos algo de muito valor.
Nesse padrão depressivo, desvalorizamos o mundo externo, nos resguardando na
segurança do mundo interno. Porém, isso até que nos recuperemos da perda e
voltemos a nos interessar pelas coisas do mundo. Sigmund Freud (1856-1939)
denominou esse processo de ‘luto’. O sujeito se coloca retirado do mundo
externo (onde ocorreu a perda), em nome de acomodar internamente a realidade
daquilo que se perdeu.
Na forma natural chamada de luto, o sujeito deprimido sente uma tristeza
que o conduzirá a desvalorizar as pessoas e as coisas do mundo externo, contudo
ainda manterá sua autoestima num nível consideravelmente bom. Isso servirá para
manter o funcionamento mental, mesmo que rebaixado, trabalhando de forma
saudável.
Contudo, se o relacionamento que se mantinha com esse alguém (ou aquilo)
que foi perdido, era mantido de uma forma perturbada, muito provavelmente após
a perda, se desencadeará uma depressão patológica. Esse modelo de experiência,
Freud chamou de ‘melancolia’. Aquele (ou aquilo) que se foi, levou junto com
ele inúmeras questões mal resolvidas. Muito provavelmente culpas e sentimentos
tão desconfortáveis que sequer puderam ser nomeados, eram características do
vínculo que tem seu desfecho no modelo patológico da depressão depois da perda.
O sujeito não é capaz de acreditar em si mesmo depois da perda ocorrida.
Passa a depreciar-se desacreditado de seu valor próprio. O amor do objeto
perdido era essencial para que continuasse contando com a sua autoestima.
Sigmund Freud (1856 - 1939) |
Na depressão melancólica ou patológica, a perda no mundo externo leva ao
rebaixamento da autoestima em certo nível que compromete o funcionamento
saudável da mente. Isso por que o sujeito não pode continuar funcionando bem
sem aquele (ou aquilo) que perdeu. Enquanto na depressão normal (processo de
luto), a perda é do objeto amado, na depressão patológica (estado de
melancolia) o que se perde é a capacidade de amar.
Outra forma de desfecho patológico da depressão é quando não se encontra
espaço emocional para que se viva a depressão natural do processo do luto. Na
impossibilidade de se viver o processo depressivo natural, compreendido no
luto, existe um risco de se desenvolver a forma patológica dessa experiência
psicológica. Quando por alguma razão, não se pode dar o real valor para a
experiência da perda, talvez isso se mantenha de forma inconsciente. Dessa
forma, a experiência que foi então proibida de ser vivida conscientemente,
passa a atuar na vida do sujeito definindo escolhas que na realidade são
incongruentes com o bom funcionamento mental.
O método psicanalítico propõe-se a criar um espaço emocional na dupla
compreendida pelo analista e paciente, onde este ultimo poderá reconhecer não
só ‘quem’ ele perdeu, mas ‘o que’ perdeu junto desse alguém. Na realidade é a
criação de um espaço que o paciente possa levar toda tristeza que inunda sua
alma por conta da perda ocorrida e na segurança do vínculo com o analista,
possa criar um sentido para sua depressão.
Prof. Renato Dias Martino
Fone: 17- 991910375
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3 comentários:
Renato, muito esclarecedor seu texto, e coincide com uma palavra que hoje pela manhã tomou meu pensamento: Que falta me faz aquele "espaço".
Grata.
Gostei muito de seu artigo. Objetivo e bem explicativo.
Achei meio confuso, mas creio que seja porque eu estou confusa. Vejo-me nas 2 depressões. Não tem sido fácil, tampouco suportável...
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