quinta-feira, 24 de maio de 2012

Mas, e sobre o amor?

Isso que chamamos de amor pode partir de certa forma rudimentar de relação emocional, em sua forma mais simples, de ligação intensa e momentânea que expira assim que se alcançou esse objetivo, que, se assim for, certamente está na ordem da satisfação sexual.

Pode também se estender, de maneira durável, muito provavelmente por ser possível prever o retorno da necessidade que acabara de cessar através da satisfação. Não parece absurdo chegarmos à conclusão de que é esse o primeiro motivo para criar-se uma forma duradoura de relação com o objeto sexual. Sem duvida é esse o primeiro e maior causa para que seja possível continuar ligado a ele, enquanto não se encontra apaixonado.
Esse vértice de pensamento tem inicio nas obras de Sigmund Freud (1856-1939) que publicou vários ensaios tratandodas cogitações sobre o amor. Em 1921 publica “Psicologia das Massas e Analise do Ego”, que traz uma importante dissertação sobre o estudo do amor. No capitulo VIII, Freud descreve de maneira muito clara certa etapa do desenvolvimento afetivo da criança:

“Em sua primeira fase, que geralmente termina na ocasião em que a criança está com cinco anos de idade, ela descobriu o primeiro objeto para seu amor em um ou outro dos pais, e todos os seus instintos sexuais, com sua exigência de satisfação, unificaram-se nesse objeto. A repressão que então se estabelece, compele-a a renunciar à maior parte desses objetivos sexuais infantis e deixa atrás de si uma profunda modificação em sua relação com os pais. A criança ainda permanece ligada a eles, mas por instintos que devem ser descritos como ‘inibidos em seu objetivo’. As emoções que daí passa a sentir por esses objetos de seu amor são caracterizadas como ‘afetuosas’.”

A partir dessa colocação freudiana é possível dizer que a saúde dos vínculos depende então, da capacidade de efetuar certo grau de síntese entre o amor não sensual e afetuoso e o amor sexual que parte do instinto. E esse modelo primário de experiência de vínculo servirá ao sujeito como molde para as relações futuras em sua vida amorosa. Fica claro que a capacitação adquirida das experiências vividas nas primeiras relações, servirá de base para que o sujeito sinta-se seguro o bastante para enfrentar a dura tarefa de vinculação fora do âmbito da família original.


Dentro dessa perspectiva, passamos tratar o amor como certa ordem de capacidades e como toda capacidade, também o amor, depende do exercício de erros e acertos para que possa se desenvolver. Assim como só se aprende acertar errando, também só se aprende amar, amando. Essa capacidade é permeada pela experiência da perda, como não poderia ser diferente já que a origem da palavra vem do Latim CAPACITAS,referente à largura, amplidão, ou ainda de CAPAX, que diz respeito a aquilo que pode abranger muito, um exercício que conta com a presença do vazio. Só pode desfrutar da amplidão aquele que compreende o vazio o que nos remete diretamente à ideia do psicanalista indiano naturalizado inglês Wilfred R. Bion (1897 —1979) em sua obra publicada em 1970, Atenção e Interpretação; quando nos propõe a inteiração entre continente e contido.
Nesse modelo Bion descreve um continente que se dispõe vazio podendo receber com acolhida certo conteúdo. Não precisaremos ir muito além desse ponto de vista para perceberemos que aquele que é capaz de conter-se a si mesmo, é mais capacitado para amar (acolher) o outro. Aquilo que não pode estar “dentro” nunca poderá ser amado. Permanece no mundo externo, material e dependente dos órgãos dos sentidos, dessa maneira, deve receber o valor que compete a essa dimensão. Isso coincide com a ideia do principio do vazio da qual os mestres orientais já cogitavam. O vazio é um dos conceitos fundamentais do pensamento oriental, do qual Bion muito provavelmente tenha se inspirado para o desenvolvimento de seus estudos. A importância do conceito fica evidente se percebermos que aquilo que está lotado não pode receber nada. Então, se estivermos falando da dimensão emocional, se nossa mente estiver entulhada de preocupações, não podemos pensar (amar) direito.
Isso nos leva a propor que, aprendemos a amar justamente na falta do objeto amado. A cada amor perdido, por mais dolorida que possa ser essa ordem de experiências, é justamente através dela que teremos a chance de nos amadurecer afetivamente e nos tornarmos mais capazes de amar. Além disso, é justamente na perda que temos a chance de reconhecer nossos próprios limites, o que será muito útil e nos qualificará para arriscarmos nas próximas escolhas afetivas.
Uma ocorrência de grande importância nessa proposta de pensamento é o fato de que, a condição fundamental para lidar melhor com a perda está justamente na qualidade do vínculo que pôde se estabelecer com o amor que foi perdido. Quando o modelo de ligação afetiva esteve na ordem de certa dependência, ou seja, na situaçãodo outro encontrar-se demasiadamente apossado do amor do eu, quando ele se afasta, o eu sente-se impossibilitado de se auto estimar.
O sujeito passa então, a se culpar pela solidão sem aquele que tanto (o) amava. Condena-se por não ter sido bom o bastante ou por outra justificativa dessa mesma ordem.
Para que a perda do outro não seja catastrófica o sujeito deve impreterivelmente ser capaz de amar-se a si mesmo, isso garantirá uma forma menos drástica dessa experiência. Não obstante, quando não se é capaz de reconhecer-se a si mesmo e assim ser capaz de amar-se a si mesmo, ficamos a mercê do amor do outro e muitas vezes seguimos nos mantendo em relacionamentos falidos, por medo das conseqüências da solidão. Impossibilitados no amor do si mesmo ficamos propensos a sofrer de forma arrebatadora na situação da perda do amor outro.

Prof. Renato Dias Martino
Psicoterapeuta e Escritor
Fone: 17-30113866
renatodiasmartino@hotmail.com
http://pensar-seasi-mesmo.blogspot.com/

Nenhum comentário: