sábado, 25 de dezembro de 2010

Dica de filme - Spider: Desafie Sua Mente

Spider - Desafie Sua Mente

Título original: (Spider)
lançamento: 2002 (Canadá)
direção:David Cronenberg
atores:Ralph Fiennes, Miranda Richardson, Gabriel Byrne, Bradley Hall.
duração: 98 min
gênero: Drama

Sinopse -
Spider (Ralph Fiennes) é um sujeito estranho e solitário. Após um longo período de internação em um hospital psiquiátrico, ele regressa às ruas do East End de Londres, lugar onde cresceu. As imagens, os sons e os odores dessas ruas começam a despertar lembranças de sua infância que há muito haviam sido esquecidas. No coração das memórias de Spider encontra-se o grande trauma da perda de sua mãe. Ele acredita que seu pai, o encanador Bill Cleg (Gabriel Byrne), matou a esposa para que uma prostituta tomasse seu lugar e fosse morar em sua casa.
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Prof. Renato Dias Martino
Psicoterapeuta e Escritor
Fone: 17-30113866
renatodmartino@ig.com.br
http://pensar-seasi-mesmo.blogspot.com/

USO ABUSIVO DO ÁLCOOL


Gostaria de pedir um espaço na atenção do meu caro leitor para colocar algumas palavras sobre aquela que julgo ser a droga mais poderosa da atualidade. Chamo a assim, pois é diferente de drogas como a cocaína, da qual é necessário que o sujeito se arrisque e vá até o traficante para consegui-la. É diferente também das drogas farmacológicas que dependem de uma receita médica, quando não, exige que se burle a lei para se obter e assim usar as de “tarja preta”.
Falo aqui de certa droga que é vendida indiscriminadamente (muitas vezes para menores de idade) em qualquer esquina (custando centavos a dose) e o pior, de enorme acessibilidade nas prateleiras dos super mercados. Escrevo aqui sobre a droga que sorrateira e silenciosamente ajuda a destruir as personalidades, as relações entre pessoas, famílias, sem contar na promoção de acidentes catastróficos e isso tudo com o aval da sociedade e da lei. Essa droga é a mesma que patrocina os principais programas de TV e enriquece os cofres públicos (assim como o cigarro) com arrecadação de impostos.
Contudo, minhas palavras vêm, sem duvida, acompanhadas da consciência de que o mal não se encontra no álcool, que por si só não tem vontade própria e existe na civilização há tanto tempo quanto o homem. Parece-me que o mal está no desequilíbrio daquele que faz uso compulsivo e assim abusivo dessa poderosa droga.
Estamos aqui cogitando sobre mais um dos instrumentos que vem sendo eleito para dar conta de certa compulsão, hoje muito comum.
A frase estampada nas propagandas: “se beber não dirija” (em minha opinião visivelmente ineficaz), não se enquadra só no ato de dirigir um carro, mas, dirigir-se ao outro, dirigir-se ao mundo, dirigir a própria vida. O mal não está na bebida, mas em sua acessibilidade e a forma como vem sendo utilizada. O problema está naquele que conduz sua vida sob o efeito do álcool e assim dificilmente produzirá algo bom.
Na realidade a proposta aqui está menos focada naquele sujeito do qual o uso do álcool é representado como uma patologia de dependência, mas ao sujeito comum que está longe de admitir o perigo existente na forma como faz uso da bebida alcoólica.
Falo aqui de algo que é prazeroso apenas para aquele que bebe e isso, muitas vezes, à custa do desprazer do outro. Na realidade, onde existe um sujeito usando o álcool de forma abusiva, sempre existirá “no mínimo” mais alguém sofrendo.
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Prof. Renato Dias Martino
Psicoterapeuta e Escritor
Fone: 17-30113866

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

A compulsão social


4. Luciano Alvarenga - "As pessoas tem trabalhado demais, comido demais, consumido muito, desejando mais ainda. Estas coisas podem ser apontadas como sintomas de que tipo de problemas emocionais na sua opinião?"
Prof. Renato Dias Martino - Tentativas inúteis de tampar um vazio que na realidade e inevitavelmente, habita cada alma desse mundo. Mecanismos de defesa da mente.
Entretanto, a presença interna de um modelo de ambiente tranqüilo nos sugere a esperança. Permite-nos desejar aquilo que esta fora do real, porém, dentro do possível. Capacita-nos a tolerar esse vazio interno sem que nos ocorra à urgência de arrancá-lo de nos. Para arrancar um desconforto elegemos um meio inesgotável de prazer, nas compulsões que nos levam a "fazer de mais" certas coisas, como você coloca.
Poder tolerar faltas, se distingui completamente da busca pela certeza, que só se consegue com o real concreto, ou o material. Ai então percebemos aquilo que poderíamos chamar de compulsão social. Uma ânsia desenfreada pelo "ter", mais e mais.
Isso coincide justamente com a ausência da formação de um modelo de paz interior, indispensável na vida do bebê e que será indispensável na vida do adulto, mas agora como ambiente interno, ou seja, dentro do peito. O que no fim não esta distante daquilo que abordamos nas questões anteriores.

Prof. Renato Dias Martino


São José do Rio Preto, SP, Brazil


tenho me dedicado à pratica clínica da psicanálise desde 2003 onde conclui graduação em Psicologia na UNORP -- S. J. Rio Preto/SP. No exercício desse trabalho clínico, tenho a abordagem psicanalítica na corrente de Freud, Klein, Winnicott e Bion, como principal instrumento, conduzindo esse pensamento através de constante estudo. Ministro aulas de teoria psicanalítica e desenvolvimento da personalidade na UNILAGO em Rio Preto e coordeno grupos de estudo na introdução à psicanálise. Mantenho um blog, onde se encontram disponíveis os materiais em forma de textos dedicados a reflexão. http://pensar-seasi-mesmo.blogspot.com/ Além da dedicação ao estudo e a pratica da psicanálise, tenho atuado na área das artes, na musica onde trabalho a mais de 20 anos tanto na pratica quanto no ensino da musica. http://dmartinorb.blogspot.com/ renatodiasmartino@hotmail.com Twitter: @renatodmartino

Produção de audio - Leandro (UNILAGO)
Produção de video Desirèe Leonel D´Martino

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

‎3° parte da entrevista Luciano Alvarenga ao Prof. Renato Dias Martino.


3. Luciano Alvarenga- "Do ponto de vista da psicanálise como está sendo visto a questão gay".


Prof. Renato Dias Martino - Essa questão é extremamente delicada e que se deve cuidar com certa cautela. A idéia psicanalítica para o homossexualismo é de uma escolha narcisista de objeto sexual.

Algo deve ter ocorrido na primeira infância para deslocar o objeto sexual que estaria no outro, para si mesmo. Agora a escolha é de um "outro", mas com a condição que esse outro seja igual a si mesmo. O corpo que ele deseja é um espelho do seu.

No texto "Sobre o narcisismo, uma introdução" de 1914, Freud sugere um modelo interessante. Ele coloca que na impossibilidade do reconhecimento do desejo do outro, o sujeito deve desejar a si mesmo. Assim, quando buscar seu objeto de prazer, desejará apenas aquele que for igual (homo). O outro só poderá satisfazer seu prazer dessa forma.

Para que haja o desencadeador da escolha hétero, deve haver um corte na relação entre mãe e filho (função paterna). A presença do pai fará esse corte na relação, se responsabilizando pelo rompimento de alguns elementos da relação entre mãe e filho. Só dessa forma o sujeito se vê desimpedido para fazer suas escolhas sexuais adequadas. Poderíamos dizer que a criança deve reconhecer que foi desejado pela mamãe, mas que ela é do papai.

Freud chamava essa dolorida, mas necessária posição de terceiro excluído. A criança deve suportar ser o terceiro excluído na relação pai, mãe e filho. Caso contrario, buscará sempre um espelho que na realidade deveria ter vivido na sua tenra infância. Justamente com a mãe, contudo podendo contar com o pai para salva-lo desse paraíso escravizador que é o vínculo simbiótico com a mãe. Um modelo de vínculo que se permanecer sem mudanças, pode limitar severamente a escolha sexual. Quando procurar alguém agora, irá procurar alguém como aquele que ansiava que sua mãe desejasse, e isso coincide com ele mesmo. É como se dissesse: "Escolho agora o que eu desejava que minha mãe escolhesse, eu".

Entretanto, o homossexualismo é um fato e como nunca foi diferente nas culturas, está presente também na nossa sociedade contemporânea. Na realidade assumir a escolha homossexual é antes de tudo um recurso para continuar funcionando bem, mentalmente e continuar amando. É a busca de maneiras de se conseguir amar.
A ideia começa a ficar preocupante quando falamos de uma classe especial de homossexuais, os reprimidos. Aqueles que não podem conter em si mesmos, impulsos dessa espécie. E passam a odiar tudo que se parece com isso. Isso por odiar o homossexualismo que não encontra lugar em sua própria personalidade. Projeta isso que é seu, no outro e age com hostilidade para com ele. Como temos visto nos noticiários sobre agressão homofóbica.

Prof. Renato Dias Martino
São José do Rio Preto, SP, Brazil
tenho me dedicado à pratica clínica da psicanálise desde 2003 onde conclui graduação em Psicologia na UNORP -- S. J. Rio Preto/SP. No exercício desse trabalho clínico, tenho a abordagem psicanalítica na corrente de Freud, Klein, Winnicott e Bion, como principal instrumento, conduzindo esse pensamento através de constante estudo. Ministro aulas de teoria psicanalítica e desenvolvimento da personalidade na UNILAGO em Rio Preto e coordeno grupos de estudo na introdução à psicanálise. Mantenho um blog, onde se encontram disponíveis os materiais em forma de textos dedicados a reflexão. http://pensar-seasi-mesmo.blogspot.com/ Além da dedicação ao estudo e a pratica da psicanálise, tenho atuado na área das artes, na musica onde trabalho a mais de 20 anos tanto na pratica quanto no ensino da musica. http://dmartinorb.blogspot.com/ renatodiasmartino@hotmail.com Twitter: @renatodmartino



Produção de audio - Leandro (UNILAGO)
Produção de video Desirèe Leonel D´Martino

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

"A procura da mãe"


Texto: Entrevista de Luciano Alvarenga ao Prof. Renato Dias Martino.

Luciano Alvarenga - "Na sua experiência clinica em seu consultório, você escreveu recentemente que 90% das pessoas que você atende está a procura da mãe. O que é isso exatamente?"


Prof. Renato Dias Martino - Digo isso porque a figura materna, sobretudo, nos primeiros meses da vida é de importância crucial na formação da personalidade. Um pensador inglês chamado Donald Winnicott, chegou a dizer que o bebê não existe se não pela mãe (ou aquela que ocupa esse lugar). Se para existir o bebê necessita da mãe, então falhas ai, vão estar pra sempre relacionadas à capacidade de acreditar na própria existência.


Logo, absurdos dentro dessa ordem de experiências, são geradoras de dores psiquicas que podem nos acompanhar pela vida toda. Angustias e ansiedades que dificultam nossa capacidade de pensar, interferem em nossas relações com as pessoas e em nossa capacidade de amar.


Essa classe de dor emocional, muitas vezes não encontra palavra pra expressar. Justamente porque vem de uma época, onde não se podia contar com o recurso verbal, não se sabia falar.


Assim é a dor que recebemos nas clínicas psicológicas. Justamente algo que se sente, mas não se sabe dar nome. Não se consegue verbalizar. O maior papel do psicoterapeuta é bem esse. O de auxiliar nessa tarefa nomeadora de sentimentos.


Lembrando aqui, que quando falo da falta dessa mãe atribuo a metade da cota de responsabilidade à figura paterna. Uma mãe que decide criar um filho sem a presença de alguém que ocupe essa posição (paterna) talvez, não imagina como ele encontrara obstáculos na vida, por conta disso.

Prof. Renato Dias Martino


São José do Rio Preto, SP, Brazil


tenho me dedicado à pratica clínica da psicanálise desde 2003 onde conclui graduação em Psicologia na UNORP -- S. J. Rio Preto/SP. No exercício desse trabalho clínico, tenho a abordagem psicanalítica na corrente de Freud, Klein, Winnicott e Bion, como principal instrumento, conduzindo esse pensamento através de constante estudo. Ministro aulas de teoria psicanalítica e desenvolvimento da personalidade na UNILAGO em Rio Preto e coordeno grupos de estudo na introdução à psicanálise. Mantenho um blog, onde se encontram disponíveis os materiais em forma de textos dedicados a reflexão. http://pensar-seasi-mesmo.blogspot.com/ Além da dedicação ao estudo e a pratica da psicanálise, tenho atuado na área das artes, na musica onde trabalho a mais de 20 anos tanto na pratica quanto no ensino da musica. http://dmartinorb.blogspot.com/ renatodiasmartino@hotmail.com Twitter: @renatodmartino



Produção de audio - Leandro (UNILAGO)


Produção de video Desirèe Leonel D´Martino

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

"Melancolia social e a figura do pai"

Um convite ao pensamento.
"Melancolia social e a figura do pai"


Texto: Entrevista de Luciano Alvarenga ao Prof. Renato Dias Martino.
  "Renato, você vem afirmando que a sociedade está vivendo uma grande melancolia, no que consiste exatamente isso, de que maneira podemos perceber essa melancolia, como ela se manifesta?"
Luciano Alvarenga -
Prof. Renato Dias Martino - Veja caro Luciano, falo quanto à forma como nos relacionamos com as coisas do mundo e com nós mesmos.


O estado de melancolia é uma forma que se contrapõe a capacidade de viver o processo do luto. A ideia de luto é onde se toma real consciência daquilo que se perdeu. Pelo contrario, o estado de melancolia (que é um estado, não é um processo, como no luto) não se tolera a idéia da perda.


O que eu percebo na sociedade que a gente está vivendo agora, é que ocorre um fenômeno muito parecido.


Um bom exemplo disso e tema já abordado por você nesse espaço é a falta da figura patriarcal. Figura da qual essa sociedade renunciou, e que pesa hoje na constituição da família.


Não se encontra mais lugar para essa figura do pai, mas ao mesmo tempo, se padece com a ausência desse semblante.


Freud tem um texto chamado LUTO E MELANCOLIA de 1917, onde propõe a ideia de estado de melancolia. Também na melancolia social que vivemos, não se consegue escolher outro objeto para substituir aquele que se foi. Situação que ocorreria naturalmente no processo do luto.


O que percebemos é que a ausência de algo que foi derrubado fez com que se desmoronasse algo muito importante. E isso toma uma proporção ainda maior se nos lembrarmos que, filhos que nascem de um ambiente desestruturado, dificilmente terão outras chances pra estruturar-se a si mesmo.



Prof. Renato Dias Martino


São José do Rio Preto, SP, Brazil


tenho me dedicado à pratica clínica da psicanálise desde 2003 onde conclui graduação em Psicologia na UNORP – S. J. Rio Preto/SP. No exercício desse trabalho clínico, tenho a abordagem psicanalítica na corrente de Freud, Klein, Winnicott e Bion, como principal instrumento, conduzindo esse pensamento através de constante estudo. Ministro aulas de teoria psicanalítica e desenvolvimento da personalidade na UNILAGO em Rio Preto e coordeno grupos de estudo na introdução à psicanálise. Mantenho um blog, onde se encontram disponíveis os materiais em forma de textos dedicados a reflexão. http://pensar-seasi-mesmo.blogspot.com/ Além da dedicação ao estudo e a pratica da psicanálise, tenho atuado na área das artes, na musica onde trabalho a mais de 20 anos tanto na pratica quanto no ensino da musica. http://dmartinorb.blogspot.com/ renatodiasmartino@hotmail.com Twitter: @renatodmartino



Produção de audio - Leandro (UNILAGO)


Produção de video Desirèe Leonel D´Martino

sábado, 11 de dezembro de 2010

Algumas Palavras Sobre Vocação


De certo ponto de vista literal, ou em uma definição da semântica, encontramos um equivalente ao conceito de chamamento. Certo ato de chamar, ou aquilo que chama outrem. Algo que norteia, propondo uma forma de predestinação. Talvez poderíamos propor até um modelo de inclinação que possa sugerir uma tendência. Algo que, em alguns casos, pode ser descrito como talento, ou em um vocabulário coloquial, uma queda.


A vocação é aquilo que nos invoca. Convida-nos a trilhar um caminho e daí então passa a nos cobrar para que tentemos, a todo custo angariar recursos no intuito de justificá-lo. Essa ideia nos move para certa direção, muitas vezes até sem que percebamos. Algo que está de alguma forma, impresso no espírito




O que invoca não se cala. Não sossega, mesmo quando se está sossegado. A vocação tem uma relação direta com o sonhar, por conta disso mesmo quando dormimos nossa vocação está em plena atividade. Tem uma face da qual nunca se conhece por completo, mas que ao mesmo tempo, nos chama o tempo todo. Isso é o que a faz objeto de ambiguidade  como se amor e ódio disputassem espaço num mesmo pensamento. Apresenta-se num modelo artístico como um dom, do ponto de vista racional poderia chamar de mérito, ou através do vértice místico, quem sabe um chamado do destino.


Essa que pode até ser chamada de habilidade especial, é maior e claramente diferente do desejo daquele cuja alma ela habita. É uma forma de desejo, no entanto, que vem antes do eu desejante. Vocação é um exemplo claro de certo pensamento que estava no mundo antes do pensador, assim como propoe Wilfred Ruprecht Bion ( 1897 – 1979). 
Wilfred Ruprecht Bion
(1897-1979)
Uma aptidão não depende da vontade do sujeito para existir. Muitas vezes o que se deseja é exatamente não ter certa vocação. Assim como, podemos desejar ter certa vocação da qual pode parecer-nos completamente ausente em nós.


Seja qual for o modelo de relacionamento com a vocação, é um ambiente suscetível a geração da inveja. Alguém que de alguma forma não pode conhecer e assim desenvolver sua vocação, pode invejar aquele do qual, pelo menos aparentemente, desempenha bem a sua. Podemos pensar também em uma situação onde nossa vocação tenha nos levado por caminhos tão tortuosos, que invejemos aquele que (pelo menos a nossa vista) não da a mínima para essa história de vocação.


De qualquer forma, quando pensamos em um deus, sendo nós mortais e vulneravelmente destrutíveis, invejamos seu dote natural que o presenteia com a dadiva da onipotência. O mortal inveja o deus em sua capacidade de transformação do real naquilo que deseja. O mortal é fascinado com a faculdade do deus de assistir aquilo que imaginava se concretizar para seu deleite. Mas, pensando unicamente por esse vértice, deixamos de conhecer a experiência de um desafortunado que habita cada deus. O deus, de forma inversa ao mortal, inveja exatamente a possibilidade de viver cada dia como se fosse o último. Uma experiência negada a ele, um dom ausente em sua eterna existência.


A necessidade de conhecer a vocações é análoga ou, de alguma forma, coincide com a tarefa do conhecimento do eu. Descobri-la e criar um vínculo com a própria vocação é a criação de um instrumento para nos tornarmos reais no mundo. Em ultima analise, um veiculo para a realização. Uma permissão da alma para que um sonho seja percebido, contido, ou acolhido afetivamente no eu e que daí por diante se desenvolva, cunhando recursos através da criatividade, em prol da realização. Penso que alguém que pode se chamar de “bem sucedido na vida”, é aquele que conseguiu permitir que, assim como no modelo de geração do ato da copula, na própria concepção sexual da vida, algo pudesse ser recebido dentro de si e assim gerasse o novo.

Capítulo do livro Para Além da Clínica. Renato Dias Martino - 1. ed. São José do Rio Preto, São Paulo: Editora Inteligência 3, 2011.






Prof. Renato Dias Martino
Psicoterapeuta e Escritor -
Fone: 17-30113866

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

O modelo familiar humano


O que está na ordem dos instintos não se discute, apenas se respeita.



 Para que possa haver boa formação de espécimes de certa espécie é preciso respeitar certas condições mínimas necessárias, que aqui chamaremos de “CMN”. O prejuízo é certo na medida em que as “CMN” não são respeitadas. Inúmeras ameaças apresentam-se muito rapidamente. Com o ser humano não é diferente, existem “CMN” a serem respeitadas. 

Processo de reprodução do animal humano

A fêmea entra no cio e deve escolher um macho saudável o suficiente para copular. Prenha, ela inicia uma fase que a deixa cada dia mais vulnerável. Procura então um canto seguro, que, resguardado pelo macho deve ser velado.
Esse macho que já deve ter deixado claro sua capacidade , além de zelar pela proteção da mãe prenha, assim como do recém nascido, tem a função de angariar recursos  de subsistência para  garantir a tranquilidade da fêmea dedicada e em consequência disso, também da cria recente.
 
Isso enquanto a fêmea dedicar-se completamente a cuidar bem desse sujeito que  certamente está entre  as espécies mais vulneráveis quando bebê. O vínculo é a forma afetiva de se manter ligado ao outro, qualquer outra tentativa de relacionamento que não puder contar com uma base afetiva bem estruturada, revela-se superficial e frágil, desfazendo-se com grande facilidade. 
O ambiente familiar que possa contar com “CMN” torna-se o lugar onde os vínculos podem ser criados e assim, também capazes de evoluir, por conta da qualidade do acolhimento, fundamental para esse delicado processo.
Falhas na criação deste ambiente podem comprometer severamente a estruturação da personalidade daquele que nasce.



O modelo familiar em desuso

O sonho da constituição da família parece estar, cada dia, mais fora de moda. Digo sonho, me apoiando na “teoria do pensar”, de Wilfred Ruprecht Bion (1897-1979); psicanalista Indiano naturalizado inglês que acredita em um modelo onde, o pensamento vem antes do pensador. 
Wilfred Ruprecht Bion (1897-1979)


No exemplo da família, é importante que o pensamento de construí-la, esteja na mente do pensador que a realizará, antes mesmo da efetivação do projeto. Através do ensaio imaginativo ou da atividade lúdica, ensaia-se o pensamento e simula-se internamente aquilo que acontecerá. Isso proporciona uma situação onde, é preparado o espaço mental que acolherá toda a problemática emocional que acompanha a vida a dois, assim como a concepção de filhos.
O fato é que, a dificuldade narcisista de se sonhar com algo futuro, que possa incluir um “outro”, é cada vez mais frequente esse sonho parece diminui na mesma proporção em que se criam novas embalagens de produtos destinados a pessoas que optaram por viver só.
“Brincar de casinha” é algo que tem mudado de forma significativa. O espaço para o desenvolvimento do papel de mãe na vida de uma garotinha, por exemplo, quando é admitido, está condenado a um segundo nível. Isso acontece acompanhado da incapacidade de reconhecer que a probabilidade de ser mãe é maior do que qualquer outra função na vida da garotinha.
O homem que há algum tempo evadira-se da família, deixou um rastro que, agora é seguido pela mulher. Assim, o que assistimos (menos como meros observadores e mais como participantes ativos) é a formação de famílias não pensadas. Famílias que se estruturam sobre um solo arenoso de tentativas de evitá-la



Em nome de uma pseudoindependência, a dedicação à família é, comumente, encarada pelo jovem atual ou contemporâneo (muitas vezes orientados pelos pais), como uma falta de escolha, ou até mesmo como forma de comodismo. O que vemos acontecer no “lar” atual é que a dedicação à família é sem duvida função daquele que não pode ter outra escolha. A família transformou-se em uma ameaça ao crescimento do individuo, seja ele em que dimensão: profissional, pessoal... Sonhando com a independência, o homem contemporâneo acorda sozinho. Não se liga ao outro por medo de sofrer, mas, sofre, pois não pode se ligar ao outro.
Eros e Tânatos
Nesse momento é muito interessante pensarmos na teoria das pulsões, onde Sigmund Freud (1856 – 1939), médico austríaco e fundador da Psicanálise, propõem a dualidade entre pulsão de vida e pulsão de morte . A primeira estaria caracterizada pelo elo, o vínculo e em ultima metáfora, o mito de Eros, o cupido. Como deus do amor, tem a função de unir. Já a segunda traria a noção da tendência a buscar um estado anterior, ou seja, a repetição, a divisão ou desintegração das relações. Essa ordem de pulsões é caracterizada pelo mito de Thanatos, o deus grego da morte. Essas duas forças disputam naturalmente, lugar dentro de nosso funcionamento psíquico, entretanto o predomínio de uma sobre a outra é o que impede a realização do pensamento e assim, um funcionamento saudável da mente.
Pensemos agora: quem são os filhos dessas famílias não pensadas?
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Prof. Renato Dias Martino
Psicoterapeuta e Escritor
Fone: 17-30113866