segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Doar e aprender, receber e ensinar



Tempo Verdade Poussin Olgagrd -
O Tempo resgata a Verdade da Disputa e da Inveja Nicolas Poussin,
1640-2 Musée du Louvre, Paris
  Doar e aprender, receber e ensinar
O ensino não existe a priori. Isso se partirmos de um pressuposto onde a capacidade de aprender, talvez seja o que revela o objeto de ensino, e quem sabe, origina o objetivo de ensinar. Só aprendemos, ou apreendemos do mundo, aquilo que sentimos como necessidade ou desejo. Freud, em 1915, descreve o inconsciente como sendo a base geral do psiquismo humano. Ele propõe um sistema de funcionamento em que tudo que chega à consciência do indivíduo, passa primeiro pelo inconsciente. Quando aqui, se fala em inconsciente, o que se pretende é mencionar o lugar do eu onde não existe conhecimento. As linguagens racionais acessíveis nesse nível são extremamente escassas. Não temos controle desta área do psiquismo. Não somos donos de nós mesmos, nessa parte do eu. Por isso, alguns sonhos(que trazem em seus conteúdos grande material inconsciente) são tão assustadores e sem nexo; ou às vezes que nos espantamos com pensamentos, e até mesmo certos comportamentos estranhos que pensamos ou fizemos e não conseguimos achar um sentido para tal. São todas manifestacãoes do inconsciente onde se sente, mas não se sabe.


Se pudermos expandir o pensamento até essa detenção de realidade, poderíamos dizer que, tudo que chegou ao saber, passou antes pelo sentir. Sentir, desejar, são experiências extremamente individuais, a não ser na relação umbilical. O que a mãe sente ou deseja, implicará diretamente no futuro daquele que se encontra no seu interior.


Só buscamos conhecer aquilo que é ou, um dia foi objeto de nosso desejo. A saber, desejo é aquilo que parte do nosso interior e se pronuncia em direção ao mundo externo. Podemos até fazer uma analogia com o modelo nutritório, onde o bebe aprende amar aquela que o nutre. Para que exista aprendizado realmente, me aprece que as idéias devem seguir certo caminho. A partir do reconhecimento da necessidade a criação de um ambiente rico em afeto que permitirá, através da gratidão, que a “dependência” se transforme em “amor”.


Assim, na medida em que propomo-nos a apreender as coisas do mundo externo, criamos vínculos que nos permitem um melhor discernimento entre o que é real e o que criamos imaginativamente. Ou seja, podemos descobrir os limites entre o eu e o outro. Quantas vezes nos pegamos querendo saber sobre o outro, porém; será que queremos saber realmente o que ele deseja, ou na verdade o que nos interessa é saber se ele quer aquilo que esperamos que quisesse?


Se pudermos estar de acordo até aqui, podemos dizer então que, aprender é algo muito mais próximo do doar que do receber. Quando guiados por certo vértice de pensamento que compreenda o modelo continente/conteúdo, aprender é doar espaço do eu para que o outro (em idéia) se instale. Da mesma forma, o ensinar se encontra bem mais próximo do receber do que do dar. Usando um vértice semelhante, receber a demanda do que realmente cabe ser ensinado. Diferente de “empurrar” a qualquer preço aquilo que se deseja que o outro aprenda, mesmo que isso não faça sentido a ele.


Assim como em nossas relações afetivas, proponho através destas linhas a tentativa de criação de um vínculo escritor-leitor num ambiente onde prevaleça a verdade e o amor. Na verdade a união dos dois termos em amor à verdade e a verdade que existe no amor.
Dessa forma, poderíamos levantar duas questões das quais imagino surgirem nas cogitações do leitor. De que verdade estaríamos falando aqui, já que estamos frente a um conceito extremamente dependente de uma experiência individual? Penso aqui na verdade enquanto direção, onde poderíamos nos orientar. Aquela verdade que nos faz eternos pesquisadores do mundo e da vida. Aquela verdade que não sossega. Aquela que nos acorda de manhã nos cobrando um tipo de resposta que não servirá mais ao depois de amanhã. Aquela que nos vira a cara a cada encontro. Aquela pela qual só podemos nos ver orientados, mas nunca possuidores.


A segunda pergunta talvez se referisse ao amor. Que amor poderíamos estar tentando propor aqui, enquanto condição para o vínculo? Penso naquele tipo de amor que atrai as diferenças. O que necessita da diferença se encantando com isso. Aquele que se desliga do eu e liga-se no outro. Aquele que enxerga ou outro além do eu no outro.
Aquele que se propõe ensinar deve ter desenvolvido a humilde idéia de que a maior parte do que se espera ensinar nunca será aprendida. E se isso acontecer, a pretensão da confirmação do resultado é algo contrario a real efetivação do vinculo aprender - ensinar.

Prof. RENATO DIAS MARTINO
Psicoterapeuta e Escritor
renatodiasmartino@hotmail.com
http://pensar-seasi-mesmo.blogspot.com/

Fone: 17-30113866

2 comentários:

Jacqueline Ferreira disse...

Adorei! Como sempre mais uma vez um texto repleto de oportunidades para uma profunda reflexão sobre nós mesmos. E pra começar. podemos perguntar quem ensina o que a quem? O como e porque seria outra etapa.

Rogério Xis Nhoato disse...

Creio que o amor seja fundamental seja ele em qualquer aspecto. Mas o amor de Mãe sem dúvida nenhuma é definitivo para que se siga na linha de um aprendizado sádio e sem afetação. A Mãe está ligado definitivamente nos primeiros sentidos e sentimentos.Texto belíssimo e sempre abre discussões e mais comentários. Bacana!!!