Arrisco-me,
mais uma vez nessa tarefa aventurosa de dissertar sobre o amor. Assim como
amiúde, agora também correndo o risco das duras críticas dos catedráticos e
doutores com suas gravatas apertadas e suas gavetas lotadas de diplomas. Mais
uma vez aqui, exposto aos olhares reprovadores dos grandes estudiosos da
psicanálise, que, com o acumulo dos mais variados títulos, questionadores
certamente estarão, sobre a validade, fidedignidade e até a utilidade desse
texto, para a ciência ou mesmo para suas psicanálises. Muito
provavelmente, indagarão sobre eu estar sendo pretensioso ou mesmo piegas com
essa proposta de cogitação. São inúmeras as ameaças para aquele que se arrisca
nessa direção do pensar.
De qualquer maneira ainda mantenho minha proposta. Se bem
que, o farei tendo como condição levar em conta o limite do que se pode saber
sobre algo que está quase que em sua totalidade imerso no mundo desconhecido
das emoções. Uma experiência que nasce extremamente ausente da razão e almejará
por encontrar oportunidades suficientes para que possa evoluir em estágios mais
nobres do pensar.
Sigmund Freud (1856-1939) |
Ora, quem sabe a insistência de escrever sobre o amor
seja sinal de certo legado que Sigmund Freud (1856-1939) deixara para cada
seguidor, que carrega dentro de si a missão de tentar reconhecer o
desconhecido. Seja la como for, tarefa difícil a de historiar sobre o amor.
Talvez fosse mais auspiciosa a tentativa de levantar o que não pode ser chamado
de amor.
Amor do eu, ou amor para o outro? Enquanto guiados pela
psicanálise, falamos então de tendências à ligação e ao afastamento. Eros e
Tânatos disputando a energia psíquica, naquilo que se tornou a Teoria da Libido
de Freud (1920). Um lado facilita a união, pois deseja o outro, enquanto o
outro lado dificulta, por privilegiar o eu. A mistura e articulação dessas
tendências podem ser extremamente surpreendentes e perigosas na construção dos
vínculos afetivos.
Pois bem, o que pode impedir a união e que não faz mais
que dificultar que os parceiros avaliem o acordo da união de forma clara, não
pode ser chamado de amor. Não pode ser denominado amor, pois está ausente da
verdade e não é surpresa que o amor sem verdade configura-se apenas em paixão.
Penso não ser prudente chamar de amor uma experiência que ocorre entre duas
pessoas que não sejam capazes de certo distanciamento, para que se possa ter
discernimento da realidade do eu e também de certa realidade do outro. Então,
não seria absurdo propor que, o amor comporta ir para além dos cinco
sentidos.
O tal “encantamento profundo” é um sentimento extremamente
intenso, logo não pode propor a durabilidade, que é característica própria do
amor. Não me parece adequado chamar de amor algo que não seja durável. Intenso
é a paixão, e a paixão não é suficiente para manter um relacionamento durável.
Enquanto a paixão é um sentimento intenso e repleto de convites sedutores de
satisfação, o amor parece ser uma capacidade que deve se desenvolver dia a dia
e sempre junto do outro. Enquanto um é rico em satisfação imediata e eficaz na
tarefa de afastar desconfortos, o outro é muito nutritivo apesar de muito menos
prazeroso e requer grande capacidade de tolerar desconfortos.
Aquele que está vivendo uma severa carência, e em consequência disso, conduz sua vida pelos
medos e ilusões, não me parece se encontrar capacitado para amar. Alguém
desnutrido na alma talvez não consiga escolher bem a que amar e dessa forma
desvalorize sua própria capacidade. É necessário curar-se de certas feridas
emocionais que impedem o sujeito de desempenhar a capacidade de amar. Emocionalmente
fragilizado, buscará o outro apenas para suprir suas incapacidades e ainda
ousará chamar isso de amor.
Ora, o que é preciso para oferecer durabilidade a um
vínculo, além do amor? Não me parece absurdo que a resposta para essa pergunta
seja, a “verdade”, ou a capacidade de tornar-se consciente da realidade do eu e
do outro. Só assim podemos chamar adequadamente essa experiência de amor e
assim, ela basta-se por si só.
Os riscos de não considerar a verdade como componente do
vinculo é o da criação de certa relação perversa, onde um se aproveita da falha do outro
para impedir seu desenvolvimento emocional, e assim, também impedindo o
desenvolvimento do outro. Mas, dessa forma não me parece prudente, ou coerente,
chamarmos essa experiência de amor.
Desenvolver a capacidade de tolerar a frustração que se
encontra na experiência de tomada de consciência das próprias verdades, assim
como das verdades do outro é fundamental para aquele que busca saúde em seus
vínculos. A tolerância é assim, elemento fundamental no processo de
desenvolvimento das capacidades necessárias para se viver certa experiência
próxima do que realmente poderíamos chamar de amor.
Prof. Renato Dias Martino
Fone: 17- 991910375
4 comentários:
E como se "cura" severas carências ou ilusões que carregamos? o próprio funcionamento mental com o tempo dá um jeito de manter-se saudável? Ou temos que inquestionavelmente ser acompanhado por terapia quando sofremos um rompimento brusco, dependências, ou uma grande decepção de amor ou amorosa?
Maravilhoso, como sempre!
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