segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Materialismo

A importância que se pode conferir hoje ao palpável tem sua implicância no tempo em que o concreto era realmente o mais importante. Uma época da vida onde impressões sensoriais são experiências extremamente novas, tão novas que estão na ordem das primeiras impressões que se pode ter do que é mundo. Isso é experimentado a partir de necessidades internas, que em forma de impulsos se projetam no mundo externo. Num movimento natural, o bebê deve perceber que aquilo que brota de dentro dele encontra sentido em algo que está fora dele.

Um modelo muito simplificado disso se da no encontro fome-seio. O bebê sente a fome, mas não é capaz de nomeá-la, contudo, aos poucos e com a ajuda da mãe, vai fazendo a associação que esse desconforto interno tem seu representante em algo externo, ou seja, encontra na mãe um objeto que sossega esse desconforto. No movimento de nomear esse desconforto existe a introdução do afeto e cria-se um vínculo com a realidade.

Se estivermos de acordo até aqui, montamos então, um quadro esquemático onde algo que nasce no interior do eu, combina-se com algo que existe fora do eu. Descrevemos assim o protótipo da capacidade de inteiração com o real. Daí partirá a capacidade de conhecer, reconhecer e assim, confiar em si mesmo e também no outro. Falo da capacidade de manter-se ligado ao outro, ao mundo, mesmo em sua ausência material, ou seja, na ausência da confirmação sensorial.

As características da personalidade materialista têm raízes profundas na experiência da falta na capacitação do reconhecimento do real. Daí a necessidade de confirmação constante do concreto, material, o real sensorial.

De fato a tolerância da ausência do real sensorial é à base da criação e do desenvolvimento da própria personalidade.

Está ai a importância dos vínculos.

O vínculo é o que nos mantém ligados naquilo que fisicamente não está (mais) presente. Na criação disso que aqui estamos chamando de vínculo, é imprescindível a capacidade de viver a experiência da falta, ou seja, arcar com a falta deve ser algo possível. Caso contrario, quando faltar, o eu não resistirá e agirá sem pensar, ou então desistirá definitivamente de agir.
Mas, o que fica no lugar do real sensorial, em sua falta? 
O que ampara o eu nessa ausência?
 A resposta talvez esteja no elemento simbólico. O elemento sustentador desse vazio está na ordem do simbólico. Aquilo que é criado a partir de um encontro afetivo e efetivo com o real. Na medida em que se estabelece certo vínculo afetivo com aquilo que existe além do eu, inicia-se a criação de símbolos. O símbolo transcende a fome do bebê se estendendo na direção da esperança de que algo no mundo pode dar conta da ‘dor’(desconforto da fome) que vem de dentro do eu (bebê). De maneira prática, poderíamos dizer que o símbolo é uma impressão boa do que é real. A esperança na verdade. Só assim se pode ficar em paz na ausência do real.


Diógenes sentado em seu barril cercado porcães.
Pintura de Jean-Léon Gérôme de 1860.
Diógenes de Sínope, Grego, Século IV a.C.
(Sínope, 404 ou 412 a.C.-Corinto, c. 323 a.C.),
Ele entendia que o materialismo é muito fútil
e que a vida é melhor vivida com a prática da simplicidade.
Entretanto, para que se possa realmente viver sem, é muito importante que se possa ao menos, acreditar na existência daquilo do qual se abdica. Memória e desejo exercitam e intensificam aqueles aspectos da mente que derivam de experiências sensoriais.







Prof. Renato Dias Martino
Psicoterapeuta e Escritor
Fone: 17-30113866
renatodiasmartino@hotmail.com
http://pensar-seasi-mesmo.blogspot.com

Um comentário:

Jeferson Cardoso disse...

Olá Professor Renato!
Muito interessante sua matéria! Escreveu sobre o materialismo de uma forma essencial à vida e com moderação. (sorrio)
Abraço do blogueiro navegante.
Tenha uma excelente terça-feira!

Quero lhe convidar para que leia ‘O casamento de Paulo Cesar’ no http://jefhcardoso.blogspot.com/

“Que a escrita me sirva como arma contra o silêncio em vida, pois terei a morte inteira para silenciar um dia” (Jefhcardoso)