quarta-feira, 21 de setembro de 2011

O FUNCIONAMENTO MENTAL DO TORCEDOR

Aspectos da mente grupal na perspectiva individual

Não é novidade alguma, pelo menos para aquele que se arrisca na tarefa de estudar as vicissitudes da mente, que o esporte é um excelente instrumento de elaboração de inúmeras experiências psicológicas. Impulsos de rivalidade, naturais da mente humana, encontram um bom recurso para serem elaborados e sublimados por meio de atividades esportivas, ou mesmo na torcida, para um esportista, uma equipe, ou um time.
Sentimentos e emoções referentes à competitividade e à disputa estão presentes no desenvolvimento mental do ser humano e buscam no mundo uma representação simbólica dessa ordem de experiências. Quando impulsos dessa ordem não encontram representação em recursos como o do esporte, podem se manifestarem como agressão e violência.
Quero propor que existe uma necessidade básica de se vivenciar experiência dessa ordem e o esporte parece ser um meio saudável para isso. Um sujeito que não encontrou um meio saudável para viver sua rivalidade, certamente o fará em algum lugar impróprio e de forma inadequada.
Tentará viver isso no ambiente de trabalho, em seu casamento, ou mesmo de forma interna, quando o sujeito se divide em dois e passa a competir com ele próprio, não conseguindo tomar seu caminho e segui-lo para se desenvolver em sua vida.
Contudo, o sujeito que guarda em si uma cota muito grande de impulsos competitivos não elaborados, pode encontrar na sua equipe esportiva, ou ainda em sua torcida, um ambiente que o transforma, ou revela certas características das quais fora desse contexto estariam latentes. Escondidas por de traz de certa polidez social, velada por normas civilizatórias necessárias para um bom convívio.
Certas características presentes no sujeito em situação de isolamento, ou seja, sozinho, se transformam quando ele está em grupo. Como uma indefesa sardinha que isolada estaria extremamente vulnerável, mas que em grupo sente-se protegida por confundir o predador que se afasta, pois, vê o cardume como se fosse uma enorme criatura, o sujeito também se sente protegido no resguardo grupal.
Sentimentos e emoções que são impedidos de serem revelados na vida polida pela civilização, encontram nas equipes e torcidas, um ambiente seguro para se manifestarem. É como se as diferenças individuais se dissolvessem enquanto o sujeito se encontra protegido pelo grupo. Isso toma uma proporção tão grande que muitas vezes, mesmo solitário na frente de seu aparelho de televisão, o sujeito se sente tão integrado a torcida que seus desejos e emoções se mantêm ligados a toda a nação torcedora como um só anseio.
Assim, em grupo as normas de conduta já não são as mesmas que aquelas de que o sujeito tivera que responsabilizar-se quando solitário. Sigmund Freud (1856-1939), o pai da psicanálise, publica em 1921 seu ensaio “Psicologia das Massas e Análise do Ego” e introduz a necessidade de se refletir sobre o assunto.



Sigmund Freud (1856-1939)
“Partimos do fato fundamental de que o indivíduo num grupo está sujeito, através da influência deste, ao que com freqüência constitui profunda alteração em sua atividade mental. Sua submissão à emoção torna-se extraordinariamente intensificada, enquanto que sua capacidade intelectual é acentuadamente reduzida, com ambos os processos evidentemente dirigindo-se para uma aproximação com os outros indivíduos do grupo; e esse resultado só pode ser alcançado pela remoção daquelas inibições aos instintos que são peculiares a cada indivíduo, e pela resignação deste àquelas expressões de inclinações que são especialmente suas.” (Freud 1921. P.g. 35).


Freud revela com muita propriedade que a vida grupal pode trazer importantes benefícios ao sujeito, o fortalecendo e o defendendo de inúmeras ameaças, contudo, essa mesma experiência grupal compromete severamente a capacidade intelectual assim como a capacidade de pensar por si mesmo. O sujeito mais educado quando distante do grupo, incluso no ambiente grupal (e como vimos o torcedor que acompanha pela televisão, não é diferente) pode se tornar um bruto, perdendo grande parte de sua fineza.

Isso acontece porque aquele que se encontra no ambiente grupal se vê forçado a abandonar sua verdade individual e compartilhar da verdade grupal. Verdades essas que muitas vezes não coincidem. Assim, nessa experiência reside um fato de grande importância, pois o ambiente grupal traz também a chance de responsabilizar o grupo por certos impulsos do sujeito, dos quais sozinho não teria coragem de fazê-lo.

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Prof. Renato Dias Martino
Psicoterapeuta e Escritor
Fone: 17 991910375
renatodiasmartino@hotmail.com
http://pensar-seasi-mesmo.blogspot.com

Um comentário:

Desirèe disse...

Gosto muito de sua ideias e verdades.
Você transformou minha vida, e os meus conceitos te amo.