Uma leitura da obra de Donald W. Winnicott (1896 — 1971)
Para a psicanálise a fonte essencial da seleção de elementos fundamentais do funcionamento mental é sem dúvida o inconsciente.
As manifestações inconscientes povoam nossa vida, dando seus sinais através dos sonhos, de ações que fogem de nossa vontade, assim como inúmeras outras maneiras de revelar a presença de uma área obscura da mente.
Todos temos motivos inconscientes. Do assassino ao sacerdote, um por um de nós.
Não existe dúvida de que ser capaz de reconhecer esse lado existente no funcionamento mental é o que traz maior mobilidade e habilidade na capacidade de vinculação; do eu para o eu mesmo e assim, do eu para com o outro.
A manifestação transtornada do inconsciente, força o sujeito a certa tomada de posição perante a isso que, sempre que se mostra dessa forma traz consigo consequência desastrosas.
O sujeito tende ou adotar certa posição de indulgência ou então, é arremessado no polo oposto num impulso de vingança. Duas posições perigosas ante a manifestação transtornada do inconsciente.
Se tivermos ciência de que no desenvolvimento natural de uma criança, onde ela possa contar com a confiança do pai e da mãe, ela, naturalmente, deve viver experiências de se impor e coloca à prova todo seu poder de desintegrar, destruir, assustar, manobrar, consumir e apropriar-se, então, poderíamos afirmar com segurança que tudo o que conduz o sujeito aos tribunais tem algo análogo e perfeitamente compreensível na vida emocional da infância. Fica claro ai a fundamental importância de um ambiente seguro para se envolver e se desenvolver as experiência primitivas.
São experiências que devem ser vividas numa ambientalização abrigada das ameaças tanto internas quanto externas. Isso garantirá a ocorrência lúdica que só se dá podendo se contar com certo grau de proteção. Nessa fase da vida, a liberdade não garantirá o desenvolvimento, pois é carente de referências, das quais a criança tem tão pouco.
Winnicott escreve que quando uma criança rouba açúcar, ela está procurando a boa mãe de quem ela tem o direito de tirar toda a doçura. Quando a criança rouba fora de casa, ainda está procurando a mãe, mas ao mesmo tempo, a autoridade paterna que pode pôr um limite ao seu comportamento impulsivo.
O pensador inglês chama a atenção para o fato de que, na delinquência plenamente desenvolvida o que chama a atenção é a necessidade aguda que a criança tem de um pai rigoroso, severo, que proteja a mãe quando ela é encontrada.
Para Winnicott a tendência antissocial não se caracteriza de forma diagnóstica, isso por se encontrar desde o sujeito mais bem estruturado até o mais comprometido psiquicamente.
Tem certa relação direta com a privação, termo usado para situação da falta de características essenciais da vida familiar.
A tendência antissocial se caracteriza por um elemento que compele o meio ambiente a ser importante. O sujeito, através de pulsos inconscientes, compele alguém a encarregar-se de cuidar dele.
A ausência de esperança é a característica básica da criança que sofreu privação. Assim, a relações entre a tendência antissocial e a privação, está tipicamente no período que vai até a idade em que a criança começa a dar os primeiros passos.
Na tendência antissocial, houve um verdadeiro desapossamento, não uma simples carência. Houve a perda de algo bom que foi positivo na experiência da criança até certa data e que foi retirado.
Essa retirada deve ter se estendido por um período maior do que aquele em que a criança pode manter viva a lembrança da experiência.
Duas direções na tendência antissocial:
1) Uma direção é representada pelo roubo - a criança procura alguma coisa, em algum lugar, e não a encontrando, busca-a em outro lugar, quando tem esperança.
Associado a mentira, a criança furta um objeto não por estar desejando o objeto roubado, mas a mãe, sobre quem ela tem direitos.
2) Outra é representada pela destrutividade - a criança está procurando a estabilidade ambiental que suporte a tensão do comportamento impulsivo.
É sobretudo por causa da segunda tendência que a criança provoca reações ambientais totais, como que buscando uma moldura cada vez mais ampla, um círculo que tem como primeiro exemplo os braços da mãe ou o corpo da mãe. É possível discernir uma série – o corpo da mãe, os braços da mãe, a relação parental, o lar, a família, (incluindo primos e parentes próximos) a escola, a localidade com suas delegacias policiais, os pais com suas leis.
Na base da tendência antissocial está uma boa experiência inicial que se perdeu.
WINNICOTT, D. W. Privação e Delinquência. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2005.
Prof. Renato Dias Martino
Psicoterapeuta e Escritor
Fone: 17-30113866
renatodiasmartino@hotmail.com
http://pensar-seasi-mesmo.blogspot.com
2 comentários:
Olá, tenho tentado refletir sobre as causas da crescente violência em nosso país, uma escalada em direção a uma gritante desumanização que tem me tirado o sono (literalmente) gostaria de sugestões sobre literatura a respeito, no momento vou em direção das causa da violência, e em algum momento espero eu, na busca por soluções. Parabéns pelo blog.
Algumas dicas de leitura nessa direção:
http://pensar-seasi-mesmo.blogspot.com.br/2010/11/violencia-e-sociedade.html
http://pensar-seasi-mesmo.blogspot.com.br/2011/11/conflito-medo-e-desejo.html
http://pensar-seasi-mesmo.blogspot.com.br/2011/09/o-funcionamento-mental-do-torcedor.html
Obrigado!
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