Mas sobre qual experiência estamos aqui
cogitando, quanto ao “pensar”?
Se existe algum sentido em afirmar que fora do
domínio da experiência, não pode existir aprendizado, então temos aqui, como
ponto de partida para se entender o processo que compreende o desenvolvimento
mental, ou seja, como ocorre a expansão do pensamento.
Nas tentativas de examinar atentamente o que
chamamos de “pensar”, estaremos cogitando sobre a capacidade da qual os humanos
se gabam perante os outros animais, mesmo, sendo muito pouco habilidosos, no
uso deste recurso mental.
Digo isso, apoiado no pressuposto de que esses
humanos, que somos nós, ainda fazem a maior parte das suas escolhas, por
motivos, dos quais não puderam ser submetidos a um pensamento atido e dedicado.
Fazendo isso por necessidades extremamente primárias, onde, na maioria dos
casos, o pensamento não tem acesso.
O humano escolhe, sem pensar, onde a urgência
se pronuncia. Escolhe sem pensar, onde a necessidade de satisfação imediata não
permite tolerar frustrações.
Em um modelo muito primitivo de funcionamento
mental, podemos encontrar o modo como os seres humanos contemporâneo fazem suas
escolhas. Mesmo assim, tentaremos, aqui, fazer o possível para angariar o
máximo de recursos nessa breve tarefa de pensar o “pensar”.
A palavra pensar parte do Latim PENSAREA, que
diz respeito a pesar, ou avaliar o peso.
Aquilo que chamamos de “pensamento” faz parte
do processo de construção do espaço interno mental. Esse espaço interno mental
serve a várias tarefas, entre elas a de dar conta dos conteúdos internos como é
o caso das emoções e também conter aspectos colhidos na realidade. Pois bem,
mas que tipo de benefício poderia nos trazer o exercício e aprimoramento da
habilidade de pensar?
Para Freud (1856-1939), o pensar tem função
fundamental no adiamento da ação, resultado do impulso. É o que propõe nas
Formulações Sobre os Dois Princípios do Funcionamento Mental, publicado em
1911:
“o pensar, foi dotado de várias
características, entre elas a que torna possível ao aparelho mental tolerar uma
tensão intensificada de estímulo, enquanto o processo de descarga era adiado.”
O teste da realidade e seus recursos foram
criados pelo aparelho psíquico com intuito de, viabilizar o confronto das
fantasias com as informações advindas da realidade. Assim, logo percebemos o
benefício de expandir essa capacidade. Quero propor que pensar é também
capacitar-se no desempenho da vida, no que diz respeito à realização de mundo.
É a criação do continente mental que sustenta o processo do pensar, sem que se
entregue antes à ação. É quando a percepção, feita através dos órgãos dos
sentidos, indica a necessidade de ação, a capacidade de pensar pode, adiar essa
ânsia. Isso, até que se perceba com mais acuidade a realidade.
Como vimos, o
significado semântico da palavra nos orienta com grande ilustração e avaliamos
pelo pensamento, o peso das ideias. Essa é talvez a primeira das funções do
pensamento, ou a mais básica delas. A partir da capacidade em adiar ações
inicia-se, uma série de expansões na perspectiva dos processos mentais.
A psicanálise nos mostrou com muita propriedade
que só podemos aceitar no mundo real aquilo que já existe no mundo interno, ou
seja, dentro de nós. Criamos espaço em nossas mentes e, só depois, conheceremos
a realidade.
A capacidade de reconhecimento do mundo interno
é o encontro e o reconhecimento de fantasias, medos, desejos apaixonados, ódios
e tudo mais que está em nosso mundo interior. São características do incerto,
do informe. Nosso mundo interno nunca é bem definido e sempre é pobre de
referencias da razão. Por conta disso é um terreno escuro, sombrio e cheio de
ameaças. No entanto, só buscando conhecer nosso eu interior é que podemos
distingui-lo do que está fora e que chamamos de realidade. O estado emocional
do “eu” (dentro) tem menor chance de se abalar em situações e ambientes emocionalmente
danosos (fora), isso se estiver se dedicando a um reconhecimento do si mesmo. O
pensamento é, por assim dizer, a capacitação do “eu” (compreendendo o mundo
interno) na ligação afetiva com o mundo (externo).
Capítulo do livro Para Além da Clínica. Renato Dias Martino - 1. ed. São José do Rio
Preto, São Paulo: Editora Inteligência 3, 2011.
Prof. Renato Dias Martino
Psicoterapeuta e Escritor
Prof.renatodiasmartino@gmail.com
http://pensar-seasi-mesmo.blogspot.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário