quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Amarga vingança

Colaboração no texto de Francine Moreno, 'Amarga vingança'.


Dar o troco
O ato de vingar-se faz parte do instinto e é normal, entretanto, quando feita por impulso quase sempre é acompanhada por arrependimento e paga-se um alto preço pelo ódio.

Lézio Júnior/Editoria de Arte
Amarga vingança
Francine Moreno

Em março do ano passado, Jimmy Wales, fundador da enciclopédia on-line Wikipedia, dispensou a namorada, a canadense Rachel Marsden, por meio da internet. O que ele não aguardava é que a vingança dela viria também pela rede, com a venda das roupas dele pelo site de leilões on-line eBay. Com pouco menos de cinco dias para o término do leilão, a camiseta, com duas manchas brancas, já havia recebido lance de US$ 15 mil. Em matéria de vingança, Rachel Marsden se saiu muito bem. Como muitos dizem sua vingança foi comida friamente. Mas nem sempre é assim. A publicitária Laura (nome fictício), de 34 anos, está aí para provar. Após uma traição do namorado, foi à casa do rapaz enquanto a faxineira estava lá. Abriu os armários e queimou toda a coleção de camisetas de time de futebol do infiel, que dormia em cama alheia há seis meses, em uma fogueira no quintal. Aliviada e com uma alegria imensa foi para casa. Entretanto, em alguns meses percebeu a encrenca em que havia se metido. Além de ganhar um processo e pagar todas as despesas da reforma do quintal, sente até hoje, dois anos após, vergonha e remorso. “Hoje entendo a frase de Carmem Sylva, que diz que a vingança é doce, entretanto à abelha custa-lhe a vida”, revela Laura. A psicoterapeuta comportamental neurolinguista Marcelle Vecchi afirma que esse turbilhão de sentimentos que envolve a vingança é comparável a um vulcão prestes a entrar em ebulição e geralmente está acompanhado da raiva, inveja e orgulho ferido. “Quem deixa seu orgulho se ferir é porque o tem enfraquecido, sujeito às opiniões e ações do outro. São pessoas que se deixam abalar, permitem que os outros exerçam muito poder sobre suas vidas, veem os acontecimentos de forma dramática e imediatista, têm dificuldades de projetar esses fatos no futuro e de analisar a situação de um outro patamar que não seja tão ruim”.

Querer dar o troco é normal e pesquisas já comprovaram que traz prazer mesmo, entretanto, dura apenas um dia. “A vingança é uma ação gerada na ausência de tolerância, logo, aquele que é movido por esse recurso primário vive num funcionamento impensado, agindo por impulso. Sendo assim, convive sempre com um sentimento persecutório, na iminência das consequências dessa vingança”, afirma o professor e psicoterapeuta Renato Dias Martino. Quem se vinga tem dificuldade de compreender a outra parte. Às vezes nem enxerga que ela mesmo pode ter contribuído para a situação. De acordo com Prof. Martino, o processo do pensamento é justamente a entrada do outro nas implicações do desejo do eu. “Na verdade, o vingativo carrega um objeto a ser vingado dentro de si mesmo. Quando a vingança pode ser submetida ao pensamento o que se percebe é que sempre está fundada em equívocos.” Uma explicação psicológica para que a vingança corra nas veias de algumas pessoas, é que ela é um recurso primitivo usado pelo aparelho psíquico com o intuito de livrar-se de sentimentos indesejados, como humilhação, injustiça e susto. Um desejo de dominar a situação. Segundo Freud ilustra em seu “Além do Princípio de Prazer (1920)”, uma situação de vingança. Ele descreve o sentimento da criança quando tem sua garganta examinada pela primeira vez. O médico abre sua garganta com um palito de madeira e olha lá dentro. Freud observa que esse tipo de ‘assustadora experiência’ será tema das próximas brincadeiras, com o coleguinha ou irmãozinho mais novo. “Na impossibilidade de vingar-se do agente da humilhação, escolhe um substituto. São todos sentimentos que em um modo mais aprimorado de funcionamento, são tolerados e posteriormente transformados em pensamento”, afirma Prof. Martino.

E nesta consequência estão constantemente experimentando e criando dentro de si sentimentos pobres de conteúdo, que com certeza a prejudicam muito mais que seu alvo de vingança. “Pela sua análise imediatista e impulsiva buscam fazer valer a sua opinião, os vingativos sofrem mais que seus alvos”, afirma Marcelle.Extravase a sua fúria com nobrezaPara que a vingança não faça parte de sua vida, a psicoterapeuta Marcelle Vecchi revela que existem maneiras de extravasar a raiva sem ‘rodar a baiana’, descer do salto e nem ser prejudicado depois. “Primeiro deve-se organizar os fatos para que fiquem claros, isso corresponde a ver a situação por diversos ângulos. Depois, aprender a dividir as responsabilidades, e por fim conversar com a pessoa a fim de esclarecer a situação. Esses são os passos de quem quer resolver a situação de forma mais nobre. Agindo dessa forma, a raiva se dissipa e toma lugar dentro da pessoa. Lembre-se que o mais prejudicado é sempre o vingador e não a vítima.”

Para o professor e psicoterapeuta Renato Dias Martino, o método para acabar com a vontade de punir aquele que te machucou requer dois elementos primordiais em forma de capacidades. Capacidade de conter sentimentos indesejáveis e a capacidade de reconhecimento dos próprios limites. “Por se tratarem de capacidades, estamos falando de algo a se desenvolver. Uma busca lenta e exaustiva, mas a única a nos colocar realmente inseridos no mundo.”

SAIBA MAIS:
Para não se tornar uma pessoa vingativa:::

Aumente sua lente de visão interna e externa, busque aprimorar sua visão emocional::

Desenvolva sua comunicação, se tiver dificuldades faça cursos para aprimorá-la::

Trabalhe sua raiva interna, se não conseguir controlá-la sozinha, procure ajuda profissional::

Desenvolva sua empatia (procure ver situações e pessoas por diversos pontos de vista), desista da premissa de achar que só o seu ponto de vista é o certo::

Cultive dentro de você sentimentos mais nobres, só você pode permitir que esses sentimentos pobres morem em seu interior, expulse-os o quanto antes e abra espaço para que outros apareçam::

Aprenda a dividir as responsabilidades e deixe de culpar só os outros, sempre temos alguma responsabilidade, mesmo que mínima, aprenda a identificá-la::

Perceba se a necessidade de vingança é recorrente, se faz parte de algo que se repete::

Analise ativamente os fatos que envolvem o desencadeador da vingança, sempre exercitando a capacidade de se colocar no lugar do outro::

Só deposite crédito no que chamamos de experiência emocional. Quando se pode viver junto com alguém uma situação de reconhecimento da própria necessidade de vingança e aprender com essa experiência. Para tanto, a psicoterapia talvez seja um lugar seguro.

Prof. Renato Dias Martino
Psicoterapeuta e Escritor
Fone: 17-30113866
renatodiasmartino@hotmail.com
http://pensar-seasi-mesmo.blogspot.com/

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