Alguém
só pode ser humano no contato com outro humano. É no campo dos vínculos que
podemos manifestar ou falhar, em expressar a humanidade. Em primeiro momento só
nos aproximamos do outro se com ele nos identificamos. A primeira aproximação é
muito mais por aquilo que esperamos ou imaginamos que o outro seja, do que por
aquilo que ele realmente é. Até por que, teremos que percorrer um longo caminho
cheio de ameaças para conhecer realmente a nós mesmos, quanto mais, ao outro em
sua realidade.
Esse
campo do reconhecimento, no processo de vinculação, está repleto de movimentos
emocionais que em sua maioria temos pouco controle.
A emoção gerada no encontro
com o outro sugere insegurança ou um vazio do (vir a ser), em outras palavras,
aquilo que se refere ao que podemos esperar da união que se pronuncia.
Neste
processo, naturalmente criamos ideias, que aos poucos se manifestam como
comportamento, dos quais tendem a repetir padrões de relacionamentos que tivemos
com nossos pais (família de origem) ou até mesmo um modelo de relação que
imaginamos ter existido entre eles.
Sempre
que nos ligamos a pessoas novas, trazemos para essa relação resquícios de
relações antigas. Modelos de funcionamento vividos anteriormente.
Relações
passadas que deixaram um rastro obscuro, onde se encontrou muito pouco, ou nem
um espaço para introdução de afeto, sinceridade e respeito. Vínculos que, de
certa forma, foram mal elaborados. Não houve experiência afetiva suficiente
para que se guardasse uma imagem boa da relação.
Isso
é o princípio do mecanismo da transferência que Freud falava. É nesse nível que
atua a psicanálise. Freud escrevera sobre a memória do amor perdido,
inexoravelmente buscado em novas afinidades. Como se tentasse construir uma
história onde de alguma forma já se soubesse o desfecho.
Assim,
agimos com apoio da memória. O conteúdo da memória não passa de uma impressão
do passado. É difícil de perceber e ser compreendido realmente ou de forma
ampla. E, quase inadequado para usarmos no hoje, a capacidade de apreender o
que acontece no presente fica danificada. Um modelo baseado em estereótipos, ou
seja, em ideias antecipadas de modelos de pessoas e coisas, que nos condena a
viver cada nova experiência como se fosse uma repetição de algo que ficou no
passado.
Tentaremos
por nossa vida toda elaborar faltas, que experimentamos em nossa vida. Um
espírito saudável tentará viver o que se precisa experimentar.
Assim,
a capacitação do ego é indispensável. Quanto maior a capacidade de tolerância
do vazio, que fica entre a relação antiga, e a nova vinculação, maior a
possibilidade de transformação da verdade e geração do novo. Capacidade de
vivenciar o luto daquilo que foi perdido, sem que isso implique na perda do eu.
Quando
o
objeto amado se vai o que fica é aquilo que falta em nós mesmos. Um ego forte é
construído pela capacidade de estabelecer vínculos. É daí que o ego se nutre.
Um
ego fortalecido é o equivalente ao nível de auto-estima, é literalmente, o
valor que se dá a si mesmo, e aqui falo daquilo que se “é” e não do que se
“tem”.
Cabe
aqui uma brincadeira, que é muito mais séria que se possa pensar. O problema
maior é a “Familite Aguda”, ou seja, quando nos prendemos na relação com nossos
pais.
Quando não aceitamos que somos o terceiro excluído no amor entre eles. E, de
tal modo, ocupamos nossas vidas com aquilo que passou, impedindo nosso caminho
rumo ao próprio destino de realizações no mundo.
Aqui
é útil lembrar, que os pais (inseguros com sua própria auto-estima), muitas
vezes, estimulam a produção desse visgo de culpas que, não permite ao sujeito
se desvincular e viver a sua própria experiência.
Essa
herança “maldita” não depende da presença física daquele que impede o
desligamento, isso ocorre primeiro internamente, depois no mundo externo.
Quando uso a expressão “maldita”, quero propor toda a ambiguidade que nela se
encontra.
Assim,
“maldita” por propor um destino negro, de amarras repletas de culpas, e também
por se tratar de uma relação de pouca sinceridade, onde as palavras são sempre
ditas de forma hostil e em suas metades, nunca de forma integral e verdadeira.
Capítulo do livro: MARTINO, Renato Dias. Para Além da Clínica - 1. ed. São José do RioPreto, São Paulo: Editora Inteligência 3, 2011.
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Prof. Renato Dias Martino
Psicoterapeuta e Escritor
São José Do Rio Preto - SP
São José Do Rio Preto - SP
Fone: 17-30113866
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