domingo, 7 de julho de 2024

ADIAMENTOS E RENÚNCIAS NO FUNCIONAMENTO DA MENTE - Prof. Renato Dias Mar...


FUNCIONAMENTO MENTAL
 
O que realmente existe é o processo primário. O processo secundário é simplesmente uma consequência de ser capaz de adiar satisfações imediatas e adiar a evitação de desconfortos. Quando o sujeito tem esta capacidade de tolerar frustrações, ele entra num processo secundário. Ele deixa o princípio do prazer/desprazer em standby, por assim dizer. Ele não deixa de existir, porque ele é um fluxo do inconsciente, da pulsão e ele passa a admitir o outro além da minha satisfação, além da minha evitação de desconforto existe o outro.

ADIAR OU RENUNCIAR

Quando a gente fala de renúncia, a gente está falando necessariamente de desejo. Você não pode renunciar de vontades. O que eu estou chamando de vontades? De necessidades básicas. Não tem como renunciar necessidades básicas. Se você renunciar as necessidades básicas, você morre. Mas você pode adiar e esse adiamento, esta capacidade de adiar necessidades básicas é que faz com que o sujeito se adeque à vida com o outro. O bebê vai amadurecendo emocionalmente, o bebê vai se capacitando emocionalmente, essa capacitação se desdobra na capacitação afetiva, a partir da capacidade de adiar a satisfação imediata, adiar as necessidades básicas. Adiar a necessidade de se alimentar, lá na fase oral. Ele já é capaz de adiar a necessidade de se alimentar, de mamar. Por quê? Porque ele reconhece que existe a mãe e a mãe tem suas vontades, independente dele. Na segunda fase, na fase anal, ele vai aprender a adiar a necessidade de evacuar e a partir daí ele vai desfraldar. E por aí a fora, no desenvolvimento.

DESEJO

Agora, quando a gente fala de renúncia, nós estamos falando de desejo. O bebê não deseja, ele passa a desejar quando, no decurso do suprimento da satisfação desta vontade, acontece alguma falha. Ocorreu alguma falha; desenvolve-se um desejo. O é o desejo? O desejo é um substituto da vontade. Eu tenho uma vontade, que é necessidade básica, essa vontade teve uma falha, não foi suprida de maneira suficientemente boa, então eu elenco, eu elejo um objeto substitutivo para isso. Não é somente aquilo, mas é aquilo, mais alguma outra coisa do mundo externo que eu escolhi. E aí, é uma escolha, porque tem a ver com ilusão. Imaginando que vai dar conta daquilo que falhou, mas aquilo que falhou já ficou lá atrás, já não tem mais jeito. Mas esse objeto de desejo passou a ser uma ilusão de satisfação daquilo que ficou lá atrás, por isso que o desejo é uma grande ilusão e precisa ser renunciado. Porque ele nunca vai trazer essa satisfação, essa satisfação ficou lá atrás. A criança precisa da atenção dos pais. A atenção dos pais é necessidade básica. A criança precisa que os pais prestem atenção nela, deem atenção a ela e ela não consegue isso. Falha esse suprimento da vontade de ser o centro das atenções. No quê? Naquilo que o Freud chamou de “narcisismo primário”. A criança precisa se sentir o centro das observações dos pais, das atenções dos pais. Quando a criança não consegue isso, ela vai procurar no mundo externo, algum objeto substitutivo para isso. Hoje, por exemplo, existe o videogame, o celular, então ela encontra o celular e este celular vai ser, agora, o objeto de desejo dela. Supre aquilo que faltou? Não! Nunca vai suprir e é justamente isso que faz com que ela se torne compulsiva no uso desse objeto substitutivo. Eu estou trazendo um exemplo, mas são inúmeros exemplos que a gente pode eleger como objeto de desejo, que traz a ilusão de suprir aquilo que um dia foi da vontade, ou seja, da necessidade básica, seja ela fisiológica ou emocional-afetiva.

PSICOTERAPIA E DESILUSÃO

O espaço da psicoterapia, do processo psicoterapêutico, traz a possibilidade do sujeito se desiludir a conta gotas, devagarinho, até que ele seja capaz de renunciar daquele desejo. Renunciar daquele desejo que, na realidade só está fazendo com que ele desperdice suas energias e não consiga aquilo que ele imaginava poder conseguir. Por que renunciar desse desejo? Porque é pecado? Porque é proibido? Não! Porque é um desperdício de energia. Então, o nosso papel, enquanto psicoterapeutas é acolher o sujeito para que ele possa entrar num acordo com a realidade. Este acordo com a realidade vai mostrar para ele que, aquilo ali, que ele tá fazendo é uma ilusão e que ele está se auto prejudicando fazendo aquilo. Ele tem que se livrar daquilo? Não! Ele não tem que se livrar daquilo. Não é papel do psicanalista dizer: “você tem que largar disso!” Não! Você não tem que largar disso, pelo contrário, você pode continuar fazendo isso, mas você precisa aos pouquinhos ir reconhecendo que isso é uma ilusão.




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