sábado, 21 de dezembro de 2024

APRENDENDO COM AS EXPERIÊNCIAS - Prof. Renato Dias Martino


SABER

Por que que eu não gosto de usar a palavra saber? Porque ela, eventualmente vai ser implicada na ideia de conhecimento, na ideia de intelectualidade, na ideia de acúmulo de conhecimento e quando a gente fala de maturação emocional, quando a gente fala do campo emocional, do funcionamento emocional, o aprendizado não resulta no saber no conhecimento, mas resulta na maturação emocional, na capacitação emocional, que não tem a ver com saber. Por mais que a gente ouça as pessoas falando sabedoria: “sabedoria é diferente de inteligência”, saber é saber, é diferente de maturação emocional, é diferente de capacitação emocional, que vai qualificar o sujeito a uma atitude afetiva mais madura. Então, uma coisa não tem nada a ver com a outra. O conhecimento, ele está dentro da perspectiva de “saber sobre”, o funcionamento emocional está dentro da perspectiva do “estar sendo” e este “estar sendo” qualifica o sujeito para se relacionar com o outro. Então, este estar sendo no âmbito emocional qualifica o sujeito na ligação com o outro, num vínculo bem-sucedido. Então, não tem a ver com saber. Ninguém sabe amar, ninguém sabe se relacionar com o outro, mas o sujeito é capaz de se relacionar com o outro e consigo mesmo anteriormente.

DO SABER AO ESTAR SENDO

O conhecimento é um desdobramento, é uma consequência de viver a experiência. Aquele conhecimento que é adquirido através da teoria, aquele conhecimento que é transmitido de uma pessoa para outra pessoa, é um conhecimento superficial e que, na melhor das hipóteses, vai servir como possibilidade de nomeação de uma experiência que o sujeito tenha vivido. Este conhecimento que é transmitido de uma pessoa para outra através de uma aula, seja através da leitura de um livro, ele é superficial e extremamente fugaz. Ele serve só para aquela pessoa que aprendeu com outra pessoa transmita aquilo para uma terceira pessoa, mas ela não consegue usar, porque ela não viveu a experiência daquilo. Agora, se ela viver a experiência, aí este conhecimento transmitido entre uma pessoa e outra pode servir como possibilidade de nomear uma experiência que o sujeito tenha vivido. Do saber ao estar sendo! Então, este saber serve como nomeação do “estar sendo”.

APRENDENDO PELA EXPERIÊNCIA 

Num curso de psicanálise. Então nós vamos falar sobre transferência. O que é que o Freud chamou de transferência? O Freud chamou de transferência o fenômeno que acontece em que o paciente transfere elementos das suas vivências anteriores para o analista. Ele começa a se relacionar com a analista não como uma pessoa nova que ele está conhecendo, mas como pessoas que ele conviveu no passado. Isto é uma teoria. O sujeito teve essa aula no curso de psicanálise, se ele não viver uma experiência clínica em primeiro momento dele como paciente transferindo para o analista suas questões e depois viver ele como analista recebendo transferências do paciente, isso para ele é superficial. Isso tudo é uma conversa muito bacana transmitida do professor para o aluno, mas que não vai sair dali. Eu não posso chamar isso de um conhecimento real, porque não foi vivido na prática, não foi vivido na experiência. Agora, quando ele vive isso na experiência, seja dele como paciente com o seu analista, ou seja, dele como analista para o seu paciente, isso vai servir como nomeação dessa experiência que ele viveu. Aí ele vai dizer: “Então isso é que é transferência?” Aí ele aprende.

SABER TEÓRICO

O sujeito que se forma e passa num concurso para Juiz de Direito, por exemplo. É um sujeito que passou a maior parte da sua vida estudando livros, se preparando para concursos e nunca viveu a sua vida na prática. Ele não teve um convívio com as pessoas. Ele não teve um convívio, por exemplo, se ele for da área trabalhista, ele não teve um convívio, por exemplo dentro de uma empresa. Nunca foi empregado, nunca foi patrão... Ele viveu o tempo todo estudando, enfronhar nos livros e pesquisando o que é que ele precisava decorar para passar neste concurso. E aí, ele vai passar num concurso para juiz e vai começar a julgar pessoas dentro de uma perspectiva que ele nunca viveu, dentro de um universo que ele não tem a menor experiência. Ainda assim, ele vai julgar essas pessoas. Ele é uma pessoa extremamente inteligente, ele tem um conhecimento enorme, mas ele não tem vivência afetiva para ocupar a função.

PREPARO EMOCIONAL 

Pior ainda é quando o sujeito foi colocado no papel de juiz sem ter sequer se preparado teoricamente para tal. Nós assistimos aí, nas últimas semanas, um juiz do STF comparando a liberdade de expressão com o ato de um policial jogar um sujeito da ponte. Ele disse assim: “Então, se a liberdade de expressão for tolerada, jogar um sujeito da ponte também tem que ser tolerado”. Comparou a liberdade de expressão com a experiência de um policial despreparado pegar um sujeito e jogar de cima de uma ponte e ele afirmou isso com toda veemência como se ele tivesse falando uma grandiosidade. O título que o sujeito consegue dentro da sua hierarquia do saber do poder não garante a seu preparo emocional e afetivo para estar dentro daquela função.

APRENDER E AMAR

O real aprendizado parte da insegurança. Ninguém aprende nada se estiver seguro. Ele começa a aprender a partir da sensação de insegurança. Então, ele se sente inseguro, mas este aprender com a experiência só vai realmente se efetivar quando ele encontrar um vínculo que possa restabelecer a sua segurança. O despertar vem da dor. O sujeito desperta quando ele se sente inseguro, quando ele sente a dor, mas o aprendizado só acontece a partir do acolhimento. Quando ele é acolhido, ele passa a aprender com aquela dor que ele tenha sentido. A dor é o que desperta o sujeito, mas o aprendizado vem com o vínculo saudável que ele possa estabelecer com o outro. Porque, qualquer aprendizado que possa vir sem se vincular com o outro é um saber egoísta, é superficialmente narcisista. Todo aprendizado precisa incluir o outro. A gente só aprende com quem a gente ama. Não dá para aprender com uma pessoa se a gente não amar esta pessoa. Eu preciso me doar a esta pessoa, eu preciso estar aberto para esta pessoa, para que eu possa aprender com esta pessoa. Em qualquer aspecto. Qualquer aprendizado que não venha dessa experiência amorosa, afetiva é um aprendizado superficial, fugaz, efêmero, que não vai servir para nada, a não ser para o sujeito arrotar arrogâncias e prepotência.

SOCIAL OU AFETIVO 

Muitas vezes, a gente confunde vínculos sociais com vínculos afetivos. O vínculo social, o encontro social é uma coisa e o encontro afetivo é outra coisa. O encontro social não te traz nutrição, não te traz aprendizado. Ninguém aprende num convívio social. Você aprende num convívio afetivo, na troca afetiva, num vínculo saudável. O vínculo saudável traz nutrição em todas as esferas. A vida social é configurada, estruturada e mantida pela dissimulação, pela falsidade. Sociedade é igual a falsidade. Encontros sociais são mantidos por falsidade, por superficialidades, por máscaras.


Nenhum comentário: